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Resumo
Resenha de Sergio Pripas (org.), Cronos ensandecido – sobre a agitação no mundo moderno. São Carlos, Edufscar, 2009, 166 p.


Autor(es)
Ana Lúcia MacDowell Gonçalves Gonçalves
é psicanalista, mestre em Comunicações e Semiótica.

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 LEITURA

Uma pequena joia

[Cronos ensandecido: sobre a agitação no mundo moderno]


A little gem
Ana Lúcia MacDowell Gonçalves Gonçalves

Sim, uma pequena joia, multifacetada, encantadora e erudita na medida certa, surpreendente e cativante nos ângulos inesperados ao longo da leitura. A difícil tarefa de organizar textos que vão compor um livro é ricamente recompensada pela harmonia, pelo ritmo, na leitura dos diferentes autores, sem falar na qualidade tanto da escrita quanto do saber transmitido. "Saber com sabor" assim define a discípula de Roland Barthes, Leyla Perrone-Moysés, o estilo de seu mestre, que aqui também se aplica. O conjunto oferece uma espécie de epistemologia do tempo: os diferentes discursos, olhares, recursos com que se faz uma meditação sobre o tempo, de seu impacto nas mais diversas áreas do conhecimento humano. O saber de cada capítulo é quase sempre acompanhado pelo sabor da surpresa com que o autor aborda o tema, vindo, por assim dizer, pelas bordas. Como não se surpreender quando o físico inicia com um relato de um cotidiano tão prosaico quanto sem mistérios para depois trazer o grande mistério do tempo perante o qual os físicos se debatem desde sempre? É assim que o leitor vai sendo introduzido não a "clichês" ou formas cansativas e pedantes de entender o tempo e seus efeitos; cada artigo traz, além de seu saber, o talento de escrita daquele que certamente sobre o tempo se debruçou não só com seu cérebro como com sua alma. Certamente, quando se fala de tempo é seu caráter irrecuperável que mais impacta e o que mais determina seus efeitos emocionais, sociais, culturais e científicos. Como entender aquilo que passa e não retorna, como administrar e capturar, para dar um mínimo de racionalidade e compreensão, o mistério que nunca deixa de existir?

 

Na sua introdução, o médico Sergio Pripas nos leva ao Xingu, à vivência de um tempo tão diferente daquele que o homem dito civilizado está acostumado e aprisionado: lá não existe a "pressa imotivada". Ali há o "‘tempo certo': aquele adequado e necessário para contar, encantar e decantar as lembranças" (p. 9).

 

O tempo é uma dimensão dentro da qual nascemos imersos e pode ser visto de maneira multívoca, seja como os ciclos astronômicos, naturais, agrícolas, seja sob a forma de calendários, seja pela História ou ainda classificando nossa vivência como passado, presente e futuro (p. 9).

 

É o caminho que o livro toma: qual o tempo de cada um, de cada saber e de cada vivência?

 

Começando com "Uma questão de tempo", o físico Adilson J. A. de Oliveira mergulha no cotidiano de correria de uma família comum, aquela que leva filho para escola, corre para chegar ao trabalho, com um olho no relógio e outro no trânsito, na tarefa, no atraso e na quase onipresente ansiedade. É o que chama de uma "visão humana do tempo", que analisado deste ponto de vista - humano - varia para cada pessoa, e cada fase da vida; o tempo da criança escorre lento, enquanto o adulto nunca o tem suficiente.

 

A sensação de passagem do tempo, seja ele de maneira mais rápida ou mais lenta, é algo que os seres humanos percebem com facilidade. Entretanto não há nada, nas leis da Física, que comprove de fato que o tempo passa. Algo que nosso cérebro percebe com tanta facilidade pode ser apenas uma ilusão (p. 19).

 

A partir daí o leitor é levado numa viagem sobre como o pensamento e a observação se dedicam a fazer uma ciência que aborde o tempo; a cada resposta a uma pergunta, nascem outras tantas, e mais válida e útil a teoria se mostra. As descobertas sucessivas que sempre remetem a mais uma, sempre o tempo escorregando de uma definição precisa; embora se chegue às franjas do Absoluto, como é o caso das chamadas invariantes, uma das quais, a velocidade da luz, é o esteio das teorias atuais do tempo. De Copérnico a Newton, e deste a Einstein, cada passo dado traz luz, mas logo há enigma, mesmo para Einstein. Este marca a definição do tempo como uma quarta dimensão e, mais, liga o tempo à gravidade da Terra que altera a passagem do tempo: o tempo passa a ser o conceito de espaço-tempo.

 

O grande obstáculo diante do tempo enquanto invariante - ou ilusão - é a Segunda Lei da Termodinâmica, que estabelece que uma vez que a harmonia ou a estabilidade de algo sofre interferência, nunca mais se volta ao estado inicial, gerando entropia. Com maestria e simplicidade, sem perder o rigor, Adilson vai abordando conceitos sutis e complexos que são como "aperitivos" para um banquete que, se o leitor quiser, buscará em textos mais específicos, e, por que não dizer, infindáveis, pois em Física sempre uma coisa puxa outra, do muito grande ao muito pequeno, da cosmologia à mecânica quântica, sempre correndo atrás de como definir este tempo que escapa e nunca deixa de ser mistério mesmo para aqueles que demolem mistérios como profissão.

 

Em "O ser sem tempo", Sergio Pripas recorre à mitologia grega - o Deus Chronos, o devorador de seus filhos - para ilustrar a quase patologia dos "escravos do relógio": o "atual culto à velocidade pende para o lado mais insano do vasto território que é a fronteira da insanidade e da patologia mental. Fica-se à mercê do tempo" (p. 31). Aqueles que se colocam à "mercê do tempo" perdem limites, perdem referências, inclusive as de autopreservação, consumidos pela voracidade - do tempo e também da própria ansiedade de preenchê-lo o mais possível, abandonando a própria noção de si mesmo e de suas necessidades, sem falar nas daqueles que os rodeiam. Esta é a voracidade que abre as portas para a fobia; para a velocidade como uma necessidade e a pressa como uma virtude; a aceleração como um fetiche: a velocidade do processador, do chip, do atendimento, etc. que se não for a mais rápida gera a insuportável angústia/ansiedade que devora as entranhas quando se tem de esperar.

 

[...] tudo gira em torno da aceleração, tudo voltado para números e competição: a alfabetização das crianças, a agenda cada vez mais cheia para que elas saibam mais - mais línguas, mais esportes, mais apetrechos - tudo voltado para o "sucesso" mas nem sempre corresponde à idade correta para tal, substituindo inclusive a atividade mais importante na infância: brincar, cujo significado pode perder importância sob esta ótica (p. 32-33).

 

O resultado são crianças e jovens esgotados, estressados, deprimidos muitas vezes; a aceleração corre além da capacidade de absorção, de fruição de apreensão: há um colapso na própria razão e função do conhecimento que passa a ser objetificado; longe de ser uma forma de usufruir da vida é uma ferramenta de tormento e insaciabilidade. Há uma exaustão.

 

Sergio faz comparação com outras formas de ser, e aí aponta a "cura", ou ao menos o caminho dela: a arte e o ócio. É preciso, no entanto, ler o texto todo para apreciar não só citações de autores e o tecido de seu pensamento, que aponta: "A arte e a imaginação são ainda as trincheiras ou locais de resistência à pressa" (p. 40).

 

Não pises neste lugar

Ontem de tarde havia, por aqui,

Vaga-lumes. (p. 41)

 

Assim começa "Sintaxe nos tempos de hoje", do psicanalista Plinio Montagna: o hai kai que aponta a presença e a ausência, o vazio e a lembrança que o preenche.

 

Manejamos presença e ausência de modo a aceitar que as coisas estão e podem não estar, são, mas também existe o nada. [...] Assim nasce em nosso interior um espaço virtual, no qual se instala o tempo do não ser. O símbolo só se inscreve a partir da ausência e da nossa capacidade de vivê-la. [...] Não há símbolo se o pisar for automático. [...] A leveza é maior se pudermos sentir o peso do tempo (p. 45).

 

Este pequeno trecho sintetiza de forma perfeita aquilo que Freud desenvolveu a partir da brincadeira de seu netinho com um carretel: brincando de soltar e puxar de volta, o que todo analista estuda como o fort-da: a elaboração da angústia da ausência através da simbolização num simples jogo, onde a repetição é a forma necessária para o psiquismo assimilar o vazio e a perda, ao mesmo tempo que executa a "volta" de uma presença. Sem a ausência e o vazio, a simbolização não se faz, o próprio mundo interno perde sua capacidade de formar-se. "Então, o que é o presente, o agora? É o período em que nos cabe viver nossa vida? É uma fração de segundo? [...]. É o tempo de nossa percepção? O aumento da aceleração do tempo nos caracteriza. Condensou-se o presente?" (p. 48).

 

Montagna discute como a noção de presente substitui, na pós-modernidade, a antecipação do futuro, numa quase denegação, em que:

 

Na liquidez da pós-modernidade, o presente eterno e o primado do prazer engendram uma fantasia do ser descontextualizado do tempo e do espaço, como se fora ahistórico. [...] Há uma fantasia da autocriação - a fetichização do ser autônomo [...] gera uma fantasia de autocriação (p. 49).

 

Se esta onipotência delirante seduz o homem pós-moderno, sua subjetividade se esgota, é exaurida pela hiper-estimulação, pela invasão do mundo interno que aos poucos deixa de sê-lo e passa a ser refém de um presente externo permanente. O resultado: "uma apatia, uma restrição da vida psíquica, diminuição da velocidade, cansaço corporal, empobrecimento da vida psíquica" (p. 50). A preservação do mundo interno frente a esta hiperestimulação se dá pela preservação do espaço da fantasia, do lúdico, dos "espaços reflexivos e criativos que possam abarcar a ambiguidade, a incerteza, a ambivalência e a contingência" (p. 50). De certa forma, o império da estimulação constante rouba até mesmo o sentido do tempo, introduzindo uma onipresença quase persecutória, em que o tempo paradoxalmente perde seu valor.

 

"O ritmo do tempo na vivência existencial", de Ana Claudia Yamashiro Arantes (psicóloga e filósofa), inicia-se com uma citação surpreendente, que nos ensina que esta busca frenética do sucesso e seu esgotamento estão longe de ser, como pensamos, coisa de nossa cultura ocidental moderna:

 

Os homens perdem a saúde para juntar dinheiro. Depois, perdem dinheiro para recuperar a saúde. E por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem do presente de tal forma que acabam por não viver nem o presente nem o futuro. E vivem como se nunca fossem morrer... e morrem como se nunca tivessem vivido (p. 55).

 

É Confúcio que o diz, lá pelos idos do século v antes de Cristo. As aflições humanas com o tempo não são, pois, coisa necessariamente de nossa cultura, senão marcas da própria condição humana, de qualquer época, de qualquer lugar. Ana Claudia retoma Heidegger ao afirmar que "foi a angústia a responsável pelo advento da cultura" (p. 58) e discorre sobre formas distintas de administrar a contingência humana que nunca é isenta de angústia.

 

Maria Bernadette A. Contart de Assis (psicóloga), com seu "O tempo da alma", remete à fala de um índio para o homem branco, depois de uma longa caminhada: "Preciso sentar para esperar minha alma chegar" (p. 67). As sucessivas "revoluções": a industrial e seu modelo mecânico, repetitivo; a da informação e seu modelo desterritorializado, veloz e impessoal, quase anônimo, a tecnológica com suas telinhas ubíquas acabam provocando o oposto do que a alma precisa: o silêncio para exercer a depuração, a contemplação para exercer o deleite, a calma para ter tempo de a alma chegar. O tempo da alma é fora da tecnologia, da pressa e da pressão. É como se tivesse de degustar, mastigar, processar as emoções, os acontecimentos que calam fundo, o novo e também as perdas, sobretudo estas.

 

Não se faz um luto em uma semana, duas ou três. Não é mensurável o tempo que cada pessoa em particular precisa para assimilar uma perda em seu mundo interno. [...] Emoções intensas e significativas são vividas no "tempo da alma" - o tempo de parar, o tempo de refletir (p. 72).

 

A alma pede um tempo para, na verdade, constituir as representações necessárias, para permitir, como diz Maria Bernadette em sua bela frase: "a tentativa do psiquismo de buscar um abrigo para o estímulo que ficou errante dentro de si" (p. 72). As errâncias humanas demandam um caminho às vezes longo, talvez tortuoso, para encontrar seu "abrigo", e, como todo psicanalista sabe, este abrigo é a palavra: a palavra onde cabe o sentimento e um mínimo de sentido:

 

precisamos de figuras, símbolos, palavras, narrativas, enfim, de representações que possam conter as experiências emocionais vividas no quotidiano. Para a mente o terror é a ausência de representação ou a impossibilidade de construção de significado (p. 73).

 

Nada mais propício para demonstrá-lo do que a entrevista "O tempo para o idoso" (p. 85), dada pelo bibliófilo e empresário José Mindlin, sobre o percurso de sua vida, onde o tempo da alma jamais foi esquecido e muito menos relegado ao segundo plano. Amante das palavras, dos livros, sua famosa biblioteca - sempre generosamente compartilhada para os "irmãos de alma" - não deixava de ser um testemunho e um abrigo daqueles errantes humanos que, através dos séculos, depositaram em palavras, desenhos, gravuras, em arte enfim, as tristezas, as descobertas, os amores e perdas, ou seja, a trajetória de almas cujos rastros foram sendo colhidos com dedicação e amor pelo Dr. Mindlin, provando que o tempo só pode ter valor se nele a alma tiver sua vez, o que o Dr. Mindlin viveu com permanente curiosidade e alegria.

 

Já para um jornalista, como conta Marcelo Coelho em "O relógio da redação","mais do que apressado, o jornalista é impaciente" (p. 91), há uma sensação de "pressa eterna", a atenção é permanente, o "acontecimento" nunca acaba. Regido pelo "horário do fechamento", nunca há tempo suficiente: o intervalo entre "pensar" e "escrever" se reduz ao mínimo, uma vertiginosa demanda que acaba gerando seus próprios desajustes: "O dia a dia num jornal traz consigo outra característica psicológica, além da impaciência e da propensão à ideia feita. É que o ritmo da atividade não é constante ao longo do dia" (a atividade tendendo a aumentar ao longo do dia até atingir um ritmo alucinante e estimulante antes do fechamento). Daí "desperdício de horas e escassez de minuto" (p. 92).

 

Quem devora quem? O desafio se transporta para a personalidade e gera o que Marcelo chama de "um machismo da velocidade": já não é o tempo que deve ser vencido, mas o outro que pode chegar antes - ao furo, ao fechamento, ao texto perfeito. Neste sentido, "a vivência de falta de tempo, da pressa [...] tende a ser vista com certa altivez pelo jornalista" (p. 98).

 

Se para o jornalista o tempo pode ser uma onda permanente, para o cineasta é quase o oposto: uma forma de capturar o tempo para sempre, fixá-lo: um instantâneo que nunca se desfaz. Em "Tempo Escravo, Liberte-Nos!", João Batista de Andrade faz uma viagem encantada, apresentando ao leitor como funciona, por assim dizer, a cabeça de um cineasta - um fato pequeno inicial, a narrativa, o foco que vai fechando cada vez mais, as cenas marcantes, e, sobretudo, o encanto da descoberta. Não faria sentido resumir aqui o desenrolar do texto de João Batista, pois é para ser degustado e ser embalado pela sequência - assim como se assiste a um filme. A poesia reina, o encanto captura - tudo para mostrar que, no cinema, o tempo pode ser percebido de muitas formas: pode ter começo, meio e fim; pode parar; pode ser para sempre; pode-se nunca perceber que passou; o tempo do cineasta é o tempo que aprisiona quem assiste a ele e dificilmente será tempo perdido quando a câmara está em boas mãos.

 

Em "Escrituras e leituras do tempo no universo literário", Sidney Barbosa, professor de Língua e Literatura Francesa, questiona:

 

Onde está o tempo? Fora de nós? Ou dentro de nós? Ele flui, como descreve Bergson, ou ele é feito de instantes, que por serem destacados geram mudança? É uma "duração", como quer Bergson, ou, como refuta Bachelard, "a duração não é sentida senão pelos instantes. Lembramos de termos estado, não de termos durado. A duração depende sempre de um ponto de vista" (p. 118). Em todo caso, é a morte como fantasma que ronda e coloca o tempo sempre como um perseguidor, como uma medida de vida e também de angústia:

 

todo o resto pode encontrar lenitivo, mas não o aspecto de nossa irrevogável limitação no tempo [...]. Dessa maneira, entre os sentimentos do absurdo e do não conformismo, diante da ampulheta caminha a humanidade nos curtos lapsos das vidas individuais e até mesmo das sociedades (p. 119).

 

Mas, como diz Sidney, "nem tudo é abandono e a Literatura pode, sim, vir em nossa ajuda, como todas as manifestações da Arte, consolando-nos na nossa situação de desamparo. A Literatura é o estuário onde vão desembocar todas as expressões dos sentimentos mais do que paradoxais diante do tempo. A Arte é porta-voz, menos descobre do que interpreta, cumpre sua função de "salvar-nos do tédio, da rotina, ajudando-nos, pela evasão, a levar às costas [...] a maldição de sermos efêmeros" (p. 123). De Guimarães Rosa a Roland Barthes, de Dino Buzatti a Thomas Mann, Sidney vai levando o leitor a comprovar ele mesmo, que, sim, a Literatura é uma das formas de trazer magia redentora a tal "maldição".

 

Se a arte da Literatura nos traz a magia da fantasia, da construção narrativa inusitada, a arte da Arquitetura traz a obra que perdura mais do que seus autores, como diz, em "Tempos urbanos" (p. 135), a arquiteta Sandra Regina Mota Silva:

 

muitos dos artefatos e obras produzidos pela humanidade são mais permanentes do que os frágeis e transitórios homens que os conceberam [...]. Vista como palco de um eterno fazer, desfazer e refazer de bens e artefatos materiais, a cidade expressa, como nenhum outro fenômeno, a passagem irreversível do tempo (p. 135).

 

A arquitetura dialoga com um tempo prolongado, maior que a temporada de uma vida humana, embora nunca necessariamente permanente, como ressalta Sandra Regina: "Cabe perguntar para a Roma de hoje quantas Romas sucumbiram soterradas sob séculos de intervenções sucessivas e apressadas de tantas e laboriosas gerações de impérios e repúblicas" (p. 136). Apesar do constante fazer e refazer, certas obras permanecem como testemunhas da cultura, da arte, da beleza que, ao atravessar os séculos, mantêm - para todas as épocas - a representação simbólica que ecoa na alma do ser humano em qualquer tempo. No texto (e fotos) de Sandra, a delicada trama que ocorre entre as cidades e seus tempos e poderes ressalta que o tempo que permanece em pedra, mármore, concreto não deixa porém de também ser frágil, pois afetado tanto pelas inúmeras agressões que podem sofrer, desde o turismo até a poluição. Cada geração detém sobre as preciosidades artísticas o poder de tentar parar o tempo e preservá-las, ou então, destruir as marcas de outro tempo.

 

Finalizando, o psiquiatra Sérgio Blay e a psicóloga Ana Claudia Yamashiro Arantes relatam um caso clínico em "O Mal da Ansiedade Generalizada", ilustrando os efeitos de um tempo vivido com angústia constante e as formas psicoterápicas e medicamentosas que podem tratar seus distúrbios.

 

Infelizmente, o que destoa neste conjunto de textos é a capa, que, embora culta, é equivocada: enquanto convite à leitura causa um certo choque que não corresponde ao conteúdo. Por que embalar um passeio informativo e poético sobre o tempo com uma capa escura, dilacerante e, no limite, quase repulsiva, ainda que tendo Goya e a mitologia como padrinhos? Sobre esse enigma inesgotável que é o tempo, cada capítulo é uma meditação original, sendo injusto aí caracterizar apenas uma de suas facetas. Joias são lapidadas justamente para que cada faceta tenha seu brilho e é isto que acontece nesta coletânea em que cada autor contribui com sua própria luz para que o estereótipo do título e da capa sejam diluídos na riqueza que através dos anos as diversas reflexões sobre o tempo produziram; neste sentido, talvez falte um capítulo sobre a história dos marcadores do tempo: os relógios, cuja história também certamente é fascinante, desde os primórdios dos relógios de sol e água, aos atuais relógios atômicos. Uma sugestão para um próximo livro.

 

O que fica é o encanto de saber que do tempo, não importa o século, não importa a cultura ou ciência, o enigma é um perene convite à reflexão.


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Percurso é uma revista semestral de psicanálise, editada em São Paulo pelo Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae desde 1988.
 
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