voltar à primeira páginaAutor(es) Fernanda Cristina Dias? Dias é psicóloga e psicanalista, especialista em Psicopatologia e Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP e mestranda no Programa de Pós-Graduação do IPUSP na área de Desenvolvimento Humano e Aprendizagem. Dedica-se ao estudo da mulher e do feminino em Winnicott. Leopoldo Fulgencio é psicanalista, mestre pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da PUC-SP com a dissertação " Sentidos sem-sentido", e doutorando pela mesma instituição com a tese "O Método Especulativo em Freud". voltar à primeira página
| | LEITURAMulher, o mal necessário da psicanálise Women, the necessaire malady of Psychoanal Female sexuality: the early psychoanalytic controversies
Fernanda Cristina Dias? Dias Leopoldo Fulgencio
O livro, cujo título em português poderíamos traduzir por "Sexualidade feminina, as controvérsias iniciais da psicanálise", apresenta textos das primeiras gerações de psicanalistas que dialogaram com Freud sobre o tema do feminino e da mulher. Como o subtítulo sugere, os desenvolvimentos em relação ao feminino levaram a controvérsias teórico-clínicas no campo psicanalítico, apontando para um terreno fértil de produção do saber. Essa efervescência também acarretou em segmentações que levaram à formação de dois grupos: a escola de Londres, a partir de Karl Abraham com a temática das relações edípicas arcaicas da menina-bebê em relação à mãe; e a escola de Viena, que se posicionava em torno dos pressupostos freudianos. Os artigos são apresentados em ordem cronológica, propiciando a localização das ideias no campo histórico da psicanálise. Porém o livro não contém nenhuma publicação de Freud, ainda que, nesta análise, os textos principais do autor sobre a temática do feminino tenham sido relacionados cronologicamente às publicações, para apresentar como se colocam como oposição ou complemento do pensamento de Freud, fornecendo uma complexa cartografia psicanalítica sobre a mulher e o feminino, entre os anos 1920 e 1930. Freud, em 1905, publica o texto "Três ensaios sobre a teoria da sexualidade" (1905d), dando ênfase ao entendimento da sexualidade, corpo teórico nuclear da psicanálise freudiana. Após analisar a predisposição polimorfa perversa presente no desenvolvimento psicossexual em direção à primazia genital, Freud já aponta para a dificuldade de entender esse processo no caso das meninas, que teriam de abandonar o clitóris para que a genitalidade em torno da vagina fosse instaurada. Nesse percurso, esboça o falo como o ponto central da diferença sexual, a partir da ideia de que o menino espera que todos sejam como ele, possuidores de um pênis. Após um longo período, em 1924, o texto "Dissolução do complexo de Édipo" é publicado (Freud, 1924d) e Freud elucida o papel central da fase fálica como submersa no complexo de Édipo, de forma que a constatação anatômica de ter ou não um pênis torna-se norteadora para o estabelecimento da fase genital. Porém, em 1917, sete anos antes, J. H. W. Van Ophuijsen, no texto Contributions to the Masculinity Complex in Women, bem como August Stärcke, com o texto The Castration Complex, publicado em 1920, ambos membros da Sociedade Holandesa de Psicanálise, já haviam apresentado formulações que seriam absorvidas diretamente por Freud, como o termo complexo de masculinidade. No texto freudiano "Dissolução do complexo de Édipo", as ideias de Van Ophuijsen e Stärcke exercem influência, quando fazem distinções entre o complexo de masculinidade e o complexo de castração, no entendimento da problemática feminina. Ambos conceitos são derivados de aquilo que Freud apresentou como angústia de castração, oriunda do abandono do clitóris para atingir a vagina, deslocamento que levaria à maternidade e ao ápice da maturidade sexual da mulher adulta. Na sequência, Karl Abraham, a partir do texto Manifestations of the Female Castration Complex (1922), amplia os trabalhos de Van Ophuijsen e Stärcke e constata que toda mulher encobre o desejo de ter nascido homem, a partir da inveja do pênis, e que na normalidade encontraria na maternidade uma gratificação fálica e narcísica. Tal ideia também está presente no texto "Dissolução do complexo de Édipo" (Freud, 1924d), publicado posteriormente ao de Abraham. Até este ponto, Abraham parece estar alinhado aos pressupostos da escola de Viena. Já no seu artigo seguinte, Origins and Growth of Object Love (1924), Abraham aponta para novos desenvolvimentos que funcionaram como uma espécie de divisor de águas. O texto levanta a ideia de objeto parcial, a partir da relação direta entre o pênis e o seio, encontrando no desmame a primeira castração e apontando para casos em que outras partes do corpo, ao longo do desenvolvimento psicossexual, podem relacionar-se a estes objetos, principalmente quando se analisam os casos de perversão. Como resultado dessa análise, Abraham propõe um quadro que relaciona os estágios de organização libidinal e seus respectivos objetos de amor, da fase oral à genital; da relação pré-ambivalente à pós-ambivalente; e do autoerotismo (sem objeto) ao objeto de amor. A ampliação proposta por Abraham foi a abertura necessária para que desenvolvimentos posteriores e decisivos em torno das relações iniciais entre mãe e bebê pudessem ser enfatizados na teoria desenvolvida por Klein e os chamados teóricos das relações de objeto. Ainda em 1924, Helene Deustch apresenta o texto The Psychology of Women in Relation to the Functions of Reproduction (1924), em que enaltece a vagina como um órgão genuinamente feminino, que acaba funcionando como uma espécie de "ego em miniatura" atrelando o feminino à passividade e ao masoquismo. A autora também entende que o abandono do clitóris é natural para que o corpo da mulher possa receber o masculino a partir do pênis que se aproxima. Em outra direção, o texto de Karen Horney, apresentado em 1925 e publicado em alemão e inglês em 1926, The Flight from Womanhood: The Mascilinity-Complex in Women, as viewed by Men and Women, é inaugural na constatação do problema da transmissão do saber psicanalítico. Este texto tem uma importância histórica e política na psicanálise pelo fato de uma psicanalista mulher explicitamente abordar o tema da parcialidade masculina nas concepções até então elaboradas. Horney aponta o quanto as questões socioculturais devem ser levadas em consideração no desenvolvimento psicossexual, principalmente a adaptação das mulheres à dominância masculina, que já está em curso desde a infância. A autora entendia o conceito de inveja do pênis mais apoiado na Biologia, incutindo efeitos psicológicos de inferioridade na mulher a partir de um órgão genital. Ainda em 1925, Josine Müller apresenta para a Sociedade Psicanalítica de Berlim o texto A Contribution to the Problem of Libidinal Development of the Genital Phase in Girls (1925), publicado postumamente em 1932, por seu marido, devido a sua morte súbita em 1930. A autora, assim como Deutsch, mostra-se fiel à tradição freudiana, apontando que a ênfase na estimulação clitoriana, na fase genital, é sempre em decorrência da inveja do pênis e da repressão pulsional em torno da vagina, estando a sexualidade da mulher que segue por esta via, de certa forma, infantilizada. As apresentações públicas dos textos de Horney (1925) e de Müller (1925) foram feitas no mesmo ano em que o texto de Freud "Algumas consequências psíquicas das diferenças anatômicas entre os sexos" (1925j) foi apresentado por Anna Freud no Congresso Psicanalítico Internacional de Homburg, em 3 de setembro de 1925, em nome do pai. Horney fez sua apresentação em 31 de outubro, e Müller, em 10 de novembro, aparentemente como desdobramento à recente publicação freudiana. Na sequência, o próximo artigo apresentado é uma publicação de Carl Müller-Braunschweig, The Genesis of the Feminine Super-Ego (1926). Na direção de enfatizar a passividade, presente na primazia genital em torno da vagina, e a formação superegóoica das mulheres, o autor aponta que, inconscientemente, as mulheres incorporam o desejo de serem dominadas por um homem na cena sexual, sendo esta posição passiva estendida ao caráter. Essa formulação mostra-se aliada às já apresentadas por Freud em relação à formação superegóoica frágil observada nas mulheres. No ano seguinte, Ernest Jones apresenta o texto The Early Development of Female Sexuality (1927), e também se alinha à Abraham (1924) ao verificar a importância da fase oral e das relações ambivalentes com os pais. Uma das objeções de Jones (1927) em relação à noção de castração é de que não haveria motivo para relacioná-la apenas às mulheres, uma vez que os homens também são acometidos por ela?- há medo e desejo relacionados ao pênis tanto em mulheres quanto em homens. Adicionalmente, o autor enfatiza o problema em atribuir à castração a repressão da sexualidade. Para Jones (1927), a perda do interesse sexual seria o verdadeiro alicerce das neuroses, e não a castração, sendo a fase fálica secundária, bem como o complexo de Édipo apresentaria a mesma resolução para meninos e meninas, já que ambos renunciam o objeto de amor ou seu próprio sexo em virtude da ameaça de castração. No mesmo congresso em que Jones (1927) apresenta suas ideias, Melanie Klein expõe o texto Early Stages of the Oedipus Conflict (1927), que assume grande importância nas discussões sobre a sexualidade feminina. Primeiro, porque se baseiam na análise de crianças (especialmente entre três e seis anos) e não na infância expressa a partir da análise de adultos; e segundo, porque trazem os alicerces da sua teoria sobre o desenvolvimento psicossexual da primeira infância, em que o complexo de Édipo arcaico ocupa papel fundamental. A autora enfatiza a identificação primária com a mãe, em ambos os sexos, a partir da incorporação, sendo nas meninas, a experiência de receptividade e passividade provenientes das fases oral e sádica, que levaria ao pai como objeto, peça central desta nova formulação. Klein não descarta, no entanto, a ameaça da castração e os sentimentos de culpa como aspectos importantes atuantes no complexo de Édipo. Porém, para a autora, todas as experiências pré-genitais que levam ao senso de culpa?- seja na fase oral, seja na fase anal?- já são produtos da formação do superego e operam antes do complexo de Édipo descrito por Freud, atacando diretamente a ideia de superego frágil nas meninas. Klein aponta que o conhecimento sobre a vagina já atua em paralelo à fase oral, sendo que os impulsos relacionados às primeiras excitações nesse órgão, aliados aos da oralidade, reforçariam a função de receptividade, determinante para que o pai possa tornar-se objeto de amor futuramente. Este voltar-se ao pai é acompanhado de inveja e ódio em relação à mãe, que possui o pênis do pai, sendo fortemente percebido nos primeiros impulsos edípicos, levando à atração pelo sexo oposto. Para a autora, o que poderia prejudicar o desejo de ser mãe ou a capacidade para ter um orgasmo futuramente em uma mulher não é a insatisfação proveniente da lei do incesto, mas sim o senso de culpa advindo dos ataques feitos ao corpo da mãe, nas etapas anteriores. As formulações sobre os ataques destrutivos dirigidos à mãe são o ponto de ligação de Klein a Freud a partir do conceito de pulsão de morte. Em 1928, Jeanne Lampl de Groot apresenta o texto The evolution of the Oedipus Complex in Women (1928) e, assim como outros autores, também enfatiza a relação primordial de apego à mãe, destacando que uma fixação no complexo de Édipo negativo (quando a menina fixa-se à mãe e não volta-se ao pai) é o fator determinante para alguns conflitos encontrados em mulheres, como a negação da sexualidade ou a frigidez. No ano seguinte, Joan Riviere apresenta o texto Womanliness as Masquerade (1929), fazendo alusão ao sonho de uma analisanda, em que identifica como as principais causas de conflitos em mulheres em relação ao pênis é o complexo de masculinidade, que, segundo Riviere (1929), seria a "feminilidade mascarada", "‘um tipo particular de mulher intelectual', que é heterossexual em termos de desenvolvimento, mas marcadamente masculina" ] (Grigg et alii, p. 172; tradução nossa). Ainda nesse ano, Helene Deutsch apresenta o texto The Significance of Masochism in the Mental Life of Women (1929), destacando o masoquismo como constituinte do desenvolvimento psicossexual das mulheres, estando presas ao sofrimento ligado às experiências sexuais, seja pela perda da virgindade ou pela reprodução. Dois anos depois, um texto de Otto Fenichel é publicado em inglês, sob o título The Pregenital Antecedents of the Oedipus Complex (1931); nele, apesar de colocar o complexo de Édipo como nuclear não apenas da neurose, mas do inconsciente, o autor se pergunta como se dá a troca de objeto nas relações pré-genitais das meninas, apresentando várias fases dentro do complexo de Édipo, com preocupação em entender como as mudanças de zona erógena são acompanhadas pela mudança de objeto, assim como analisou Abraham. Também em 1931 Freud publica o texto "Sexualidade feminina" (1931b), em que retoma a importância do complexo de castração na constituição da sexualidade da mulher, presente nas etapas pré-edípicas. Tendo como foco, no entanto, a passagem, na mulher, do negativo (castração) para o positivo (resolução do complexo de Édipo), ressalta não haver um paralelismo nítido entre o desenvolvimento do menino e da menina, aspecto amplamente debatido por seus interlocutores, conforme a ordem cronológica sugere. É nesse texto que Freud também começa a dar-se conta da sua limitação como analista homem diante de suas pacientes mulheres: ao ocupar na transferência o papel de pai, não podia alcançar com maior precisão como se dava a constituição psíquica da mulher. O próprio Freud pôde encontrar, nas contribuições de suas discípulas, consonância com algumas observações clínicas que obteve em casos de paranoia em mulheres, em que há a presença de hostilidade na relação da menina com a mãe. Esta seria uma pré-condição para que o complexo edípico pudesse ser estabelecido nas meninas. Neste ponto, é clara a influência das discussões que estavam em vigor, principalmente no grupo de Londres. No ano seguinte à publicação do texto de Freud, Helene Deutsch apresenta o texto On Female Sexuality (1932), retomando a questão do masoquismo como um traço basal na raiz da feminilidade e no entendimento da homossexualidade feminina. A autora, diferentemente de van Ophuijsen, não focaliza a homossexualidade como um complexo de castração, mas como uma inveja exacerbada do pênis, causada pela fixação na figura materna e por intensa rivalidade com o pai. No mesmo ano, Karen Horney apresenta o texto The Dread of Woman: Observations on a Specific Difference in the Dread Felt by Men and Women Respectively for the Opposite Sex (1932), em que verifica que os homens tentam lidar com o medo de mulher ao procurarem por uma base mais objetiva para isso, fazendo esforços para mantê-lo secreto, mas que frequentemente eram observados nos sonhos de seus analisandos, com componentes homossexuais, fetichistas e às vezes até ocultos por meio de sonhos com o pai. Desta forma, ela postula que o medo da mãe ou do genital feminino é mais fortemente represado que o medo do pai, e está presente em todos os homens, mostrando-se como uma ansiedade narcísica, diferentemente do medo do pai, que não impacta a autoestima masculina. Horney retoma o tema da negação da vagina, mas agora especificamente para as mulheres, no trabalho The Denial of the Vagina: a Contribution to the Problem of the Genital Anxieties Specific to Women (1933), em que se aprofunda na questão da suposta inferioridade da vagina em relação ao pênis nas fases pré-edípicas e verifica, a partir de alguns casos clínicos, que a vagina desempenha papel importante em termos de estimulação sexual?- refutando a hipótese freudiana em torno da inveja do pênis, mesmo antes da constituição da genitalidade. A autora se refere à negação da vagina como possível fonte de ansiedade nas mulheres, opondo-se à tese de que a vagina é descoberta apenas após o abandono do clitóris. Segundo a autora as questões em torno da inveja do pênis parecem ter um sustentáculo sociocultural importante, tendo no casamento heterossexual e na maternidade um contorno praticamente institucionalizado de como as mulheres deveriam lidar com sua inferioridade em relação aos homens ou obter refúgio na masculinidade de seus maridos e no triunfo fálico de serem mães. No mesmo ano, Freud publica o seu texto final sobre o tema "Feminilidade. Conferência 23. Novas conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos" (1933a), anunciando poucos acréscimos teóricos, mas algumas evidências clínicas que o fizeram desenvolver observações adicionais a respeito do "enigma da natureza da feminilidade" com base na "pré-história da mulher", ressaltando a importância das fases oral e sádico-anal , além da fálica no desenvolvimento psicossexual das mulheres. Mas avisa que não poderia fazer apontamentos que seguissem além da resolução do complexo de Édipo, de forma que o enigma em torno da mulher permaneceria ainda, visto as observações acerca da alternância entre o masculino e o feminino no decorrer do processo de desenvolvimento sexual. Nesste texto Freud oscila entre constatar a dificuldade de ser ele próprio um homem na busca do entendimento das condições idiossincráticas a que a mulher está submetida pela via de seu desenvolvimento sexual e a reafirmação masculina de que as mulheres: são um enigma de difícil solução; apresentam uma formação superegoica falha, dificultando o senso de justiça; sentem vergonha diante da inferioridade de seus órgãos genitais; têm pouca contribuição para a história da civilização, a não ser por saberem "tecer e trançar"; obtêm na maternidade e na feminilidade "as inestimáveis tarefas sociais a seu cargo"; e são mais débeis em seus interesses sociais, com menor capacidade de sublimar seus instintos. No final do texto, Freud conclui que caberia aos poetas ou ao desenvolvimento da ciência a continuidade no estudo da subjetividade da mulher, admitindo de maneira sincera e humilde que haveria outros aspectos que não puderam ser tocados por ele e que, pelas contribuições de seus discípulos até então, seria possível encontrar um caminho para outros desenvolvimentos sobre o tema. No ano seguinte, Marie Bonaparte apresenta o texto Passivity, Masochism and Feminity (1934), em que reforça o sofrimento ligado à perda da virgindade e à reprodução, entendendo ser o masoquismo fonte de prazer erótico para as mulheres. Aponta também para a maior aderência à bissexualidade devido à disposição anatômica: a cloaca feminina, ou seja, a região reto-vaginal, aliada ao falo atrofiado (clitóris) conferem à mulher uma natureza dupla. Desta forma, tornar-se mulher só é possível se a função maternal da vagina for alcançada, a partir da renúncia à reivindicação clitoriana, que não permitiria esta rede de identificações e o estabelecimento dos mecanismos de introjeção/ incorporação e expulsão, vivenciados no ato sexual e na possibilidade de ter bebês. E finalmente, no texto Early Female Sexuality (1935), Ernest Jones inaugura um diálogo entre as escolas de Viena e Londres (sendo ele um representante desta última), momento em que começaram a aparecer as primeiras divergências entre os grupos (curiosamente a partir de um texto sobre a sexualidade feminina). Entre as principais discordâncias estão o desenvolvimento inicial da sexualidade (particularmente nas meninas), a gênese do superego e sua relação com o complexo de Édipo, a técnica de análise com crianças e o conceito de pulsão de morte. Jones verifica que a escola de Viena, ao enfatizar a inveja do pênis, se volta mais aos aspectos físicos do desenvolvimento psicossexual da menina e menos aos aspectos intrapsíquicos. Ao final do texto, o autor faz a clássica afirmação de que não sabe se uma mulher nasce mulher ou torna-se uma. Do ponto de vista sociocultural, os desenvolvimentos teórico-clínicos apresentados se apoiam diretamente da condição da mulher oriunda do período vitoriano, herdeira de fronteiras bem demarcadas sobre o papel social em que ocupava na sociedade puritana. Neste sentido, o livro atende a este critério, explicitando as tensões entre homens e mulheres vitorianos, mesmo que a partir de personagens vestidas com o manto do saber psicanalítico. A forma como o livro se organiza fornece insumos para a constatação de que a psicanálise se alimenta dos conflitos femininos para existir e continuar em transmissão. É a estória nos contando a verdadeira história.
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