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Intervenções Psicanalíticas

ano XXXI - Dezembro 2018

21 páginas

      A frase, escolhida por Elina Aguiar como epígrafe de seu texto, ressoa em nós. Hoje, em conexão a múltiplas situações. No entanto, em seu artigo, o aviso refere-se a um contexto particular. Trata-se do alerta de um GPS - emitido quando da aproximação a um bairro de moradias precárias - que compõe uma das muitas formas evidenciadas pela autora através das quais se perpetua a exclusão social de pobres e indigentes, enredando a todos em uma trama de significações que aniquilam a experiência de si e do outro. Embora diga respeito a uma prática específica, que conversa com as experiências de psicanalistas brasileiros no atendimento a moradores de rua, a leitura do artigo também faz pensar nos efeitos de paralisação e cristalização de lugares diante de significações repetitivas e enrijecidas.

     A seção Debates dá continuidade a esta reflexão sobre práticas clínicas em diferentes contextos - nas ruas, nas praças e nos campos. Os relatos apresentados, de participantes do evento "Clínicas Republicanas e Democráticas, Clínicas Públicas e Abertas", tratam da especificidade e alcance de nossos dispositivos e afirmam sua potência.
     Um mesmo efeito de abertura da escuta é obtido com os textos sobre autismo e TDHD. O primeiro, sobre autismo, percorre a historicidade de sua invenção e aborda a epidemia em curso como sintoma. O segundo, escrito em 2009, se mantém atual. Ambos intervêm na produção discursiva contemporânea e indicam a necessária escuta da singularidade de cada sujeito. Na mesma direção encontra-se o artigo sobre o SUS, que interroga as políticas e gestões em saúde pública.
     Frente a uma realidade gritantemente violenta pelos inúmeros obstáculos que coloca à vida dos cidadãos, à partilha, à pertinência ao mundo e ao bem comum, cabe mais ainda ao analista afinar sua escuta. Este número de Percurso traz esta marca: em diferentes cenários (clínica, ruas, SUS, escolas e instituições) e mediante diversas modalidades de intervenção (enquadre tradicional, psicanálise com crianças, enquadre grupal com uso de mediadores terapêuticos, ação junto a grandes grupos), aponta- se à especificidade da psicanálise.
     Mantendo como eixo a escuta da realidade psíquica, alguns artigos instigam mais diretamente à reflexão sobre as dimensões políticas do sofrimento e expõem a necessidade de considerá-las em todas as formas de intervenção clínica. Outros enfatizam as sutilezas da alma, ressaltando a importância da poesia e da metapsicologia como companhia.
      Destacamos ainda o artigo de Leda Barone que, além de tratar da importância e particularidade da escrita do analista, aporta instrumentos para pensar a questão da indexação das revistas em psicanálise, uma vez que os critérios utilizados pelos órgãos avaliadores não contemplam a particularidade do método e do objeto da psicanálise, configurando-se como verdadeiros "leitos de Procusto".
      Ampliando a circulação da palavra entre nós, a seção Entrevistas concedeu espaço a um grupo de jovens analistas, duas delas aspirantes a membro do Departamento de Psicanálise, que entrevistou Fabio Landa. Em Debates Clínicos, desta vez é Nora Miguelez quem apresenta o caso, e os comentadores são Ana Rosa Chait Trachtemberg e Leopold Nosek.
      Lamentamos o recente falecimento de Carlos Augusto Nicéas. Uma das resenhas, "Um elogio que esclarece: Lacan - movimentos conceituais e a psicose", foi escrita em sua homenagem.