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Resumo
Resenha de Eugênio Canesin Dal Molin, O terceiro tempo do trauma, São Paulo, Perspectiva/FAPESP, 2016, 272 p.


Autor(es)
Cristiane Curi Abud
é psicanalista membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. É professora do curso de Psicossomática do Instituto Sedes Sapientiae. Professora afiliada da Universidade Federal de São Paulo, coordena o Programa de Assistência e Estudos de Somatização do Departamento de Psiquiatria da unifesp. Mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (pucsp) e doutora em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (fgvsp). Escreveu o livro Dores e odores, distúrbios e destinos do olfato (Via Lettera, 2009). É coautora do livro Psicologia Médica Abordagem Integral do Processo Saúde-Doença (Artmed, 2012). Organizadora do livro A subjetividade nos grupos e instituições (Chiado, 2015) e O racismo e o negro no Brasil: questões para a psicanálise (Perspectiva, 2017).


Notas

1.G. Rosa, A terceira margem do rio, disponível em: , p. 3.

2.A. Green. Narcisismo de vida, narcisismo de morte. São Paulo: Escuta, 1988. p. 287.

3.R. Roussillon. Teoria da simbolização: a simbolização primária, in: L. C. Figueiredo; B. B. Savietto; O. Souza. Elasticidade e limite na clínica contemporânea. São Paulo, 2013.


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 LEITURA

O terceiro tempo do trauma, a terceira margem do rio [O terceiro tempo do trauma]

The third moment of trauma, the third bank of the river
Cristiane Curi Abud

"Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos" .
 

A história de Gavrilo, garoto de onze anos, vítima de um acidente de carro que o deixou paralítico, inaugura o livro de Eugênio Canesin Dal Molin. A memória de Gavrilo, que dormia no momento do acidente, compõe-se de poucas lembranças do acidente em si e mistura-se ao que lhe foi dito e ao que leu no jornal após o acidente.

Daí por diante o autor nos conduz a uma reconstrução da história do trauma de Gavrilo e da história do conceito de trauma na psicanálise. A reconstrução é realizada pelo autor de forma lenta e gradual reproduzindo, no plano literário, aquilo que encontramos na clínica do trauma: um clima de suspense dada a expectativa ansiosa que o trauma imprime no sujeito que o vivencia. Bem à moda freudiana, a forma literária de Dal Molin converge num ambiente emocional compatível ao conteúdo tratado.

Ao citar Witold Gombrowiscz, autor polonês, Dal Molin lembra a dificuldade de contar uma história respeitando o caos que reina no início de cada evento. O problema está na quantidade de impressões que se apresentam em dado momento, o que torna sua descrição inteira impossível, levando-nos obrigatoriamente a uma seleção de quais impressões serão descritas e em que ordem elas serão descritas. Se o evento for de natureza traumática, o trabalho de seleção das impressões, sua nomeação e organização requererá mais tempo e minúcia. Dal Molin cumpre esta tarefa ao longo do livro, ao selecionar eventos da clínica, conectando-os com a história da psicanálise, mais especificamente com a história do conceito de trauma na história da psicanálise, num trabalho detalhado e cuidadoso, que mantém o leitor atento pelo clima de suspense alcançado.

O livro é fruto da dissertação de mestrado do autor. A clínica apresentada se articula à teoria sobre o trauma de dado momento histórico da psicanálise, apoiando-se, basicamente, ao estudo do conceito na obra de Freud e Ferenczi, mas não só. No final do livro, apoia-se também nos estudos de Balint e autores mais contemporâneos. O autor afirma que "as cenas traumáticas não formam uma fileira simples, como um colar de pérolas, mas se ramificam e estão interconectadas como árvores genealógicas, de forma que de qualquer nova experiência, duas ou mais conexões entram em operação como memórias" (p. 136). A reconstrução que Dal Molin realiza do conceito do trauma na história e teoria psicanalíticas segue esta complexidade onde, a cada novo elemento teórico que se acrescenta no movimento do pensamento freudiano, o conceito do trauma é re-significado, e a análise de Gavrilo acompanha essa re-significação.

Apresento então, resumidamente, esta reconstrução, pois ela pode ser um bom roteiro de pesquisa para quem se interessar pelo tema.

Inicialmente, o autor retoma algumas correspondências entre Freud e Ferenczi durante a Primeira Grande Guerra, nas quais Ferenczi notou como a guerra afetava as pessoas que dela participavam.

Ferenczi estudou os casos de neuroses de guerra, cujos sintomas físicos eram muito semelhantes aos sintomas histéricos de conversão, compreendendo-os como psicogênicos e não como frutos de lesões físicas.

Nesta fase, Ferenczi baseia-se nos Estudos sobre Histeria (1893-1895), de Freud e Breuer, para explicar os sintomas físicos como uma conversão do afeto em uma inervação motora que será mantida, mesmo depois de a situação de perigo deixar de existir. E faz uma analogia da histeria com os soldados hospitalizados, que para esses últimos limitar-se-ia ao caminho percorrido pelo afeto, uma vez que não foi possível, como o próprio Ferenczi aponta, encontrar nas anamneses dos soldados a constituição sexual que comporia o quadro nosológico da histeria de conversão.

A causa do trauma seria um afeto súbito, um choque, que não pôde ser psiquicamente controlado. A memória do trauma psíquico agiria como um corpo estranho que continua sendo visto como um agente que ainda está trabalhando. Não seria a experiência, mas sua lembrança que geraria afetos desagradáveis. A questão que se impõe é como o afeto ligado à lembrança poderia ser esmaecido. Um dos fatores de esmaecimento seria a reação energética efetiva ao evento que provocou o afeto (reação de choro, vingança, linguagem) que enfraqueceria a carga afetiva e desvitalizaria a lembrança. Se a reação é suprimida, o afeto permanece ligado à lembrança.

Para Ferenczi, a lembrança que não foi ab-reagida entra no complexo de associações, vem acompanhada de outras experiências, que podem contradizê-la, e está sujeita a retificação por outras ideias. Após um acidente, a memória do perigo e do medo são associadas à memoria do que aconteceu depois?- salvamento e a consciência atual de segurança, de modo que uma pessoa normal seria capaz de levar a cabo o desaparecimento do afeto relacionado por meio do processo de associação.

Dal Molin questiona: seria possível as memórias de Gavrilo serem incluídas nesse modo de compreensão das vicissitudes do afeto no psiquismo? Há que se pensar também no estado no qual o paciente se encontra no momento do trauma: Gavrilo estava dormindo.

E propõe uma diferenciação, pois, ao contrário da histeria de conversão que sofrem de reminiscências, diz Dal Molin,

 

os soldados com tremores localizados sofrem duplamente: do evento em si e do traço mnêmico inconsciente que o evento deixou. O complexo de associações ao redor do episodio é, por esse motivo, mais restrito. Se, por um lado, o traço de memória pode ganhar elementos, ser enlaçado por outras associações e reconstruído para formar uma representação, uma lembrança consciente do episódio; por outro o afeto despertado tem tal volume que impossibilita o acesso pleno à consciência. Quando há uma lembrança, mesmo que reconstruída, ela não pode trazer consigo toda a força da excitação afetiva que o choque gerou. Uma cota desse volume, quando não seu todo, é dirigida à parte do corpo inervada no momento do trauma e lá se fixa, gerando tremores e contraturas que formam a sintomatologia visível dos soldados (p. 41).

 

Nesses casos o sujeito perde a consciência no momento do trauma e desenvolve uma amnésia retrógrada. O choque parece desativar a consciência, que deixa de ser capaz de captar as impressões que sucedem o momento traumático.

Seguindo o movimento do pensamento freudiano, Ferenczi assimila a questão narcísica, colocando em planos similares a doença orgânica, os incômodos e o choque, levando a pensar o trauma como uma lesão ao Eu, uma lesão narcísica que represa a libido no eu.

Neste sentido, lembramos a distinção que André Green[1] nota entre a castração, a propósito da qual Freud fala de angústia, e entre o narcisismo que é ferido, sendo que este último, ao sofrer uma lesão, sofre não uma ameaça, mas uma efetiva mutilação.

De tal forma, afirma Dal Molin, que nas neuroses traumáticas prevalece o conflito entre o Eu e o mundo externo, o que provoca a hiperestesia dos sentidos. Os órgãos dos sentidos tornam-se erogenizados de maneira análoga à da hipocondria e da lesão orgânica. Eles se tornam mais sensíveis em decorrência de um estímulo externo poderoso demais para ser dominado, ou por causa de uma constante e intensa estimulação. O estado de alerta do paciente mostra a fixação do psiquismo nas experiências traumáticas e a necessidade de reagir ao que não foi propriamente dominado.

No esquema da primeira tópica freudiana, o sistema que é atingido pelo estímulo é o da percepção/consciência que faz o front com o mundo externo. Ele forma uma camada que recobre o pré-consciente e o inconsciente. O problema que o autor interpõe é se a hiperestesia dos sentidos não é exatamente uma alteração nos elementos da percepção decorrente de um distúrbio energético de grande escala que tem lugar no inconsciente.

A partir de 1920, Freud vai conceituar como traumáticas as excitações que possuírem força suficiente para romper o escudo protetor do psiquismo e invadir o aparelho psíquico. A diferença com a histeria se acentua, sendo que as histéricas sofrem de suas reminiscências e os que experimentam o trauma sofrem do rompimento de seus escudos protetores e da invasão de estímulos. A sintomatologia permanece similar.

A questão do traumatismo vai sendo compreendida a partir da dimensão econômica, das quantidades de excitação e da distribuição da libido. O choque traumático deprecia o investimento libidinal em objetos e os concentra no Eu, no sistema percepção/consciência do Eu, de tal forma que seu prejuízo assemelha-se ao encontrado nas neuroses que Freud chamou de narcísicas.

Para Freud o trauma causa um distúrbio na distribuição da energia do aparelho, toma o psiquismo e desliga o princípio do prazer. Ferenczi vai mais longe, a inundação paralisa o próprio aparelho receptor, que para de filtrar e colher amostras do exterior por meio dos órgãos dos sentidos. A paralisia sensorial despertada pelo trauma dura um tempo no qual toda impressão mecânica e mental é tomada sem nenhuma resistência, nenhum traço de memória de tais impressões permanece, mesmo no inconsciente, de modo que as causas do trauma não podem ser lembradas a partir de traços de memória.

A impressão seria um elemento original do processo de memória, não como fator informativo, mas energético. O processo de ligação pulsional passaria pela conversão das impressões em percepções e estas, mais tarde, em representações. O trauma não pode ser lembrado porque nunca foi consciente. Só pode ser reexperimentado e conhecido como o passado. As impressões vividas com desprazer continuam reverberando em algum lugar do corpo. Não tendo sido percebidas nem representadas, essas impressões são consideradas por Ferenczi como a realidade alocada em um inconsciente mais profundo.

Dal Molin passa então a discorrer sobre o processo de simbolização das experiências. Em condições favoráveis, a impressão pode ser reexperimentada, tornando-se percepção, e representação associada a outras representações. Por condições favoráveis, ele entende a resposta dos objetos aos apelos da criança.

Citando Ferenczi, escreve o autor:

 

Na maioria dos casos de trauma infantil, os pais não têm interesse em imprimir os eventos na mente da criança, ao contrário o tratamento usual é a repressão: ‘não foi nada'; ‘nada aconteceu'; ‘não pense sobre isto'; mas nunca nada é dito sobre esses feios assuntos (por exemplo, os de natureza sexual). Tais coisas são simplesmente escondidas num silêncio mortal; as fracas referências que a criança faz são ignoradas ou mesmo rejeitadas como absurdas, com a unânime anuência de todos ao seu redor, e com tal consistência que a criança deve desistir e não pode manter seu próprio julgamento (p. 220).

 

Se, por outro lado, "a mãe está à mão com compreensão e ternura e completa sinceridade, a criança pode se restabelecer mesmo do choque mais severo sem maiores problemas" (p. 209).

O autor chega, então, ao funcionamento do trauma em dois tempos: o evento traumático nuclear que a criança vive não tem efeito em si mesmo, não é neste momento traumático. Após a puberdade, um segundo evento, que reativa o primeiro, libera desprazer. Neste segundo tempo, o evento ocorrido no primeiro tempo torna-se traumático, uma vez que conecta-se com a sexualidade. Entre o primeiro tempo, daquilo que não pode ser integrado, e o segundo, no qual uma nova experiência o reativa, o evento é remodelado de uma maneira que permite maior integração, mas através de uma atribuição de sentido?- o sexual?- que faz o acontecimento algo traumático.

No primeiro tempo não há integração do vivido, que permanece como uma impressão mental, o início de uma formação traumática, à espera de ligação psíquica que transforme a impressão em representação.

O modelo de traumatismo postulado em 1920 pode integrar-se à teoria freudiana do trauma em dois tempos quando tomamos como uma experiência de choque para a qual o indivíduo não estava preparado, que demanda do psiquismo um trabalho de integração e inclusão na sua história. Gavrilo buscou na internet notícias de seu acidente, que pôde ganhar uma imagem e uma história. A narrativa encontrada nos jornais veio acompanhada de uma imagem que lhe permitia perceber e representar o acidente.

Ferenczi retoma a questão do trauma criticando Freud pela superestimação da fantasia em detrimento da realidade traumática, dos embates reais entre o Eu e os objetos externos na patogênese. Ferenczi retoma o crédito do relato da neurótica de Freud, pois constatara que muitas crianças eram de fato vítimas de abuso sexual por parte de figuras de autoridade da família ou próximas a ela. Portanto, não deveriam ser tomados como relatos fantasiosos, mas como fato vivido pelo paciente.

Ocorre uma confusão de línguas onde a criança busca ternura e o adulto traduz essa busca na sua língua, como busca sensual. Não se trata aqui de sedução, mas de paixão, descontrole, terrorismo e transformação da fantasia em realidade. Diante de uma figura de autoridade, a criança não reage com nojo ou ódio, mas fica paralisada, como os neuróticos de guerra que perdem a consciência no momento do choque.

Essa paralisia diante da incessante invasão de estímulos inclui a espontaneidade e a atividade do pensamento, no plano mental. No plano físico, há uma completa exaustão do tônus muscular e no plano psíquico, uma dissociação. Outra forma de defesa, para além da cisão, é a identificação com o agressor: a criança introjeta os sentimentos de culpa do adulto, tornando-se inocente e culpada ao mesmo tempo, o que a deixa confusa, em dúvida sobre o que aconteceu.

Na transferência, esses pacientes mostram-se muito sensíveis aos desejos, tendências, caprichos e simpatias dos analistas. O analista não deve esconder ou negar os pontos que o paciente nota acertadamente, deve legitimar sua percepção.

A formação traumática não implica só a confusão de línguas, mas o abandono, a falta de alguém que possa ajudar na metabolização da experiência.

O trauma pode chegar a três tempos, o que não significa que sempre venha a tê-los.

O primeiro tempo viria a ser o

 

momento do choque ou da comoção psíquica, da experiência que não pode ser integrada, que, a partir do exterior, rompe o escudo protetor contra estímulos. O segundo tempo que discutimos foi o de ressignificação posterior da experiência de choque?- ao ser integrado, o evento ocorrido no primeiro tempo passa a ter um efeito propriamente traumático. Entre o primeiro e o segundo tempos encontramos discutida na teoria, a partir de Ferenczi, uma fase intermediária: após o choque causado no embate com o meio externo, o indivíduo procura integrá-lo com a ajuda dos objetos externos, volta-se a eles na tentativa de ligar a experiência disruptiva. É esse tempo, intermediário na cronologia da formação traumática, mas o último a ser observado pela clínica e pela teoria psicanalíticas, que podemos chamar de terceiro (p. 220).

 

O não reconhecimento por parte dos objetos investidos das impressões oriundas do choque impede o registro e ligação psíquicos. Em outras palavras, se os objetos investidos recusam o fato ocorrido, se não legitimam a percepção da criança de ter sido abusada, compondo o que Ferenczi chamou de desautorização da percepção, a criança fica impedida de simbolizar a experiência. Aquilo que ela viveu sequer é reconhecido como tal, uma vez que opera o mecanismo de recusa da realidade na família. A própria criança, vítima do abuso, passa a duvidar se o trauma (evento) aconteceu ou não (pois o trauma aconteceu). Sua percepção sofre um ataque que impede o caminho pulsional de chegar ao simbólico. O tempo intermediário pode encerrar a formação do trauma, mas nem sempre o faz. Se o meio ambiente não oferecer elementos para a ligação e significação das impressões, esse terceiro tempo pode fixar-se num movimento, aos objetos externos, que repete as tentativas iniciais de registro que se seguiram ao choque. O modelo dos sonhos traumáticos aponta para esse movimento de tentativa de registro e ligação, busca de reconhecimento e validação pelos objetos afetivamente investidos.

O ambiente pode ajudar a transformar as impressões em percepções e estas, mais tarde, em representações. Mas pode recusar a realidade do ocorrido?- não legitimando as sensações e percepções do sujeito?- acarretando um novo choque e compondo definitivamente o trauma. Assim, a traumatogênese é inter e não intrasubjetiva. Apesar do rompimento de Freud com Ferenczi, esta ideia foi assimilada pela psicanálise. Para citar um autor atual, que tem se dedicado ao estudo das simbolizações, lembro-me aqui de Roussillon[2], para quem a simbolização requer, primeiramente, que se represente o objeto na sua ausência. Cabe então questionar a função que o objeto cumpre neste processo. Estamos diante de sofrimentos narcísicos e, portanto, não podemos ficar apenas na descrição dos processos intrapsíquicos; é preciso pensar na interação destes com as respostas do ambiente, dos objetos edípicos. Estas transformações teóricas implicam mudanças na técnica, também pioneiramente propostas por Ferenczi e rechaçadas por Freud, mas que atualmente vigoram frente aos impasses que as técnicas mais clássicas impõem aos sujeitos no embate mais com suas feridas narcísicas do que com sua angústia de castração.

Finalizo pelo começo. O título do livro, O terceiro tempo do trauma, imediatamente lembrou, pela semelhança da estrutura da frase, o conto de Guimarães Rosa, A terceira margem do rio. O que poderia ter sido apenas um trocadilho revelou-se, após a leitura do livro de Eugênio Dal Molin, uma significativa metáfora. Lembrei-me de um texto de Elisa Cintra no qual ela oferece uma interpretação para a retirada do pai para a terceira margem do rio:

 

A metáfora espacial da gestação de um "espaço psíquico" começa então a temporalizar-se: o pai é agora atividade de ser e de dar ser, de destinar a ser, de deixar o outro ser. Para deixar o outro ser é preciso manter-se retraído, "cancelado", em reserva, por isso na "terceira margem do rio", em estado "ausentemente disponível".

 

É nesse "retirar-se" que o pai rompe a relação dual e especular e reconhece na criança a alteridade, legitimando suas percepções e desejos e possibilitando sua entrada no simbólico. É na terceira margem do rio que pode transcorrer o terceiro tempo do trauma, tempo intermediário no qual os pais podem ajudar a criança a transformar as impressões potencialmente traumáticas em percepções legítimas e, posteriormente, em representações, completando o circuito da simbolização.

 

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