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ÍNDICE TEMÁTICO 
60
Homenagem a Regina Schnaiderman - raízes e devires
ano XXX - Junho 2018
195 páginas
capa: Vera Montagna
  
 

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Notas
1. H. Campos. Crisantempo: no espaço curvo nasce um. São Paulo: Perspectiva, 2004.

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 EDITORIAL

Editorial

Letter from the editors

No espaço curvo nasce um
Crisantempo 1


Com alegria comemoramos o número 60 de Percurso fazendo uma homenagem a Regina Schnaiderman. Os textos que aqui seguem testemunham a atualidade de questões que lhe eram viscerais e a força de seu legado.

Se os campos de concentração dizem muito das estruturas de Estados do século XX em que o homo sacer é figura fundamental, Nathalie Zalztman fala da exigência de pensar a solidariedade essencial entre o devir individual e aquela do conjunto humano no processo de transformação das pulsões.

Ao chegar ao Brasil, com seis anos de idade, seus pais lhe disseram que não mais falasse sua língua materna, o russo, sua língua pátria.

Com paixão, lança-se à busca sensível de línguas em que cada coisa pudesse encontrar sua melhor expressão, ser melhor dita.

Formada em química, dá aulas em que seus alunos acompanham fascinados os processos de combinação e reações dos elementos mais diversos.

Dedicava-se aos estudos de filosofia com Anatol Rosenfeld. Isso em um grupo formado por amigos como Jacó Guinsburg e Isaias Melsohn, este muito próximo desde os tempos de militância política ainda na adolescência.

Suas inquietações e o prazer do conhecimento levaram-na mais tarde à Faculdade de Psicologia da USP.

Casa-se com Boris Schnaiderman. O círculo de amigos e os estudos ampliam-se. Dos clássicos às questões das vanguardas, literatura, linguística, psicanálise; Freud, Lacan, os franceses, filósofos e psicanalistas, também os ingleses. A paixão pelas artes e a presença constante de artistas, de amigos artistas.

Contra o pensamento hegemônico e as instituições hegemônicas, a abertura para o outro.

Peter Pelbart fala do desafio de resgatar, para além da lógica do mesmo e do outro, a lógica da multiplicidade, lembrando que qualquer fronteira enunciativa é também uma gama de vozes dissonantes, dissidentes. O que é um sujeito, diz ele, senão aquele que se forma nos entrelugares, nas fronteiras, na itinerância?

Caterina Koltai traça um percurso em que aponta, por meio de deslocamentos da língua materna, a procura de uma língua estrangeira em que a escrita seja possível.

Márcio Seligmann-Silva fala da potência da condição apátrida, da superação contínua do próprio, da passagem de uma língua a outra.

Miriam Chnaiderman, em texto de grande emoção para todos nós, retoma as cartas de sua mãe e resgata na condição de apátrida o sítio do estrangeiro, o lugar do analista.

Regina tinha seu projeto de formação de psicanalistas. Tal como a IPA, concordava com o tripé estudo, análise e supervisão. Mas, ao contrário, defendia a leitura de Freud e análise e supervisão fora da estrutura vertical imperante.

A convite da Madre Cristina, com Roberto Azevedo funda no Instituto Sedes Sapientiae o Curso de Psicanálise. Nesse começo dificuldades tiveram que ser enfrentadas por conta das limitações impostas pela mesma IPA que não admitia que seus membros ministrassem cursos fora da Sociedade e tampouco que se formassem analistas fora de seus quadros. Pouco depois Regina acolhe psicanalistas argentinos que chegam exilados de violento regime de opressão, com todos os riscos que isso significava também no Brasil, mas ciente da importância política de seu gesto, e com a generosidade que lhe era tão natural. Também houve nesse momento uma identificação grande com o fato de esses psicanalistas terem enfrentado na Argentina um processo de cisão com a IPA. Mais tarde outra cisão estava em curso, agora dentro do Sedes e também pela defesa de seu projeto de formação, Roberto Azevedo indo coordenar outro grupo.

Em 1985, funda já com vários outros colegas o Departamento de Psicanálise que era o seu sonho. Sua casa, onde tal formação pudesse continuar. Três anos depois, é publicado o primeiro número de Percurso - mas isso ela não teve tempo de ver. Nele está o artigo "Política de formação em psicanálise", no qual Regina expõe sua concepção de formação.

Ler Freud, ler Freud e tudo o mais. E pensar os desafios da clínica, da clínica contemporânea, da cultura, do mundo.

Paulo Endo retoma a questão da memória e dos sonhos em Freud, e analisando sonhos de refugiados de campos de concentração fala de experiências constituídas no seio do traumático que alcançam um mais além. Garrafas lançadas ao mar que continuam propondo questões seminais.

Mara Caffé considera diversas leituras do complexo de édipo e, diante da heterogeneidade do desejo, para além da lógica do mesmo e do outro, fala da necessária sustentação da lógica do paradoxo.

O grupo do Projeto Ponte desenvolve importante trabalho com imigrantes na Clínica do Sedes Sapientiae. No centro de sua proposta: trabalhar analiticamente com os impasses da fala a partir desse lugar de estrangeiro, oferecendo um lugar de fala e pertencimento a esse que se desloca, a um sujeito que se constitui entre-línguas.

E finalmente uma palavra sobre um dos artigos que abrem este número. Em março de 2017 realiza-se no Sedes o evento A geração pós-Lacan e a clínica do negativo. Fernando Urribarri destaca em sua palestra "uma espécie de pacto fraterno geracional", as influências recíprocas entre tais psicanalistas na elaboração de suas principais obras e a constituição de uma nova matriz teórico-clínica. Após essa apresentação, Percurso, já às voltas com a pauta deste número 60, o convida para escrever um artigo em que considerasse nesses diálogos a presença dos filósofos contemporâneos. Esse longo trabalho de historicização, aquele de sua palestra e os desenvolvimentos recentes, que se propõe generosamente como contribuição para futuras pesquisas, é agora publicado. O autor destaca aspectos da riqueza das relações com filósofos como Deleuze, Lyotard e Derrida, especialmente as discussões em torno da heterogeneidade do sujeito psíquico. E fala do processo-sempre de muitos e de muitas vias - de "invenção do pensamento clínico contemporâneo".

No último dia 5, outubro de 2018, em noite de homenagem à Regina, no Sedes, ouvimos Cid Campos, filho de Augusto, cantando poesias de Augusto e Haroldo de Campos. Galáxias entre outras.

Com Roberto Aguilar tocou uma "minissinfonia" que compuseram em homenagem à Regina.

Mais tarde, a cantiga que Décio Pignatari gostava de entoar ao final de cada reunião com os amigos, "Peixe-vivo".

Miriam começou dizendo da grande emoção de fazer essa homenagem à mãe no Departamento de Psicanálise, essa casa pela qual tanto batalhou, em meio a tantos amigos, trazendo o lançamento da revista Ensejo, feita a convite de Eli Cury, cuja edição com ele coordenou.

Publicamos aqui um texto de Camila Salles Gonçalves, que a partir da leitura do primeiro número de Ensejo escreve sobre a amizade.

Boa leitura!

 


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Percurso é uma revista semestral de psicanálise, editada em São Paulo pelo Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae desde 1988.
 
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