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Resumo
Dada a semelhança entre muitas construções teóricas do pensamento de Friedrich Nietzsche e de Sigmund Freud, levantam-se suspeitas de ter ocorrido influência de ideias do filósofo sobre o psicanalista. No presente artigo, procurou-se verificar o que é possível afirmar a esse respeito, apoiando-se nas informações existentes acerca do contato de Freud com a teoria nietzschiana e no que ele próprio publicou.


Palavras-chave
Freud; Nietszche, Psicanálise; eterno retorno, além-do-homem; sonhos.


Autor(es)
Alfred Michaelis Michaelis
é bacharel e mestre em Psicologia pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo.


Notas

1.     F. Nietzsche, "O andarilho e sua sombra", in Humano demasiado humano ii, p. 161.

2.     O best-seller de Irvin Yalom, Quando Nietzsche chorou, constrói um diálogo entre Nietzsche e a nascente teoria psicanalítica servindo-se da figura de Josef Breuer.

3.     Apesar da importância do livro de Gasser, ele não foi utilizado nesta pesquisa.

4.     O. Giacoia, Nietzsche como psicólogo, p. 7.

5.     O. Giacoia, op. cit., p. 9.

6.     F. Nietzsche, Ecce homo, p. 114.

7.     R. Schlesier, "Freud, Lecteur de Nietzsche", p. 191-210.

8.     R. Schlesier, op. cit., p. 205.

9.     J. Masson, A correspondência completa de Sigmund Freud para Wilhelm Fliess, p. 399.

10.   P. Gay, Freud - Uma vida para nosso tempo, p. 58.

11.   E. Jones, A vida e obra de Sigmund Freud - v. ii, p. 344.

12.   Jones não deixa claro quais foram essas sugestões, mas provavelmente trata-se de um comentário feito uma trintena de páginas depois (p. 370) a respeito dos mecanismos dos criminosos por sentimento de culpa que Freud observa em Assim falou Zaratustra.

13.   E. Jones, op. cit., p. 97.

14.   P. Gay, op. cit., p. 58n.

15.   R. Schlesier, op. cit., p. 207.

16.   R. Schlesier, op. cit., p. 198.

17.   S. Freud, "Die Traumdeutung", in Studienausgabe Bd. ii, p. 327.

18.   S. Freud, "Sobre os Sonhos", in Obras Completas, p. 587.

19.   Como aponta Renate Schlesier, o conceito de "transmutação de todos os valores" aparece também, mas de maneira ligeiramente modificada, na correspondência de Freud, especificamente na famosa carta a Fliess de 21 de setembro de 1897, na qual Freud revela não acreditar mais na sua teoria da sedução e descreve esse momento de "depressão, confusão e exaustão" como um "colapso de todos os valores".

20.   S. Freud, "Das Unheimliche", in Studienausgabe Bd. iv, p. 257.

21.   S. Freud, "Jenseits des Lustprinzips", in Studienausgabe Bd. iii, p. 232.

22.   Schlesier fala de apenas dez ocorrências. Certamente não foi um lapso, mas uma desconsideração da primeira aparição em Psicopatologia da vida cotidiana (S. Freud, Zur Psychopathologie des Alltagslebens, p. 31), já que se trata nesse caso de uma referência de diferente natureza, pois o nome do filósofo alemão não surgiu trazido por Freud, mas em um dos casos de ato falho relatados, no qual uma pessoa anônima não lembra do nome de Jung, vindo-lhe à mente outros nomes, dentre os quais o de Nietzsche.

23.   S. Freud, "Die Traumdeutung", p. 524.

24.   S. Freud, "Massenpsychologie und Ich-Analyse", in Studienausgabe Bd. ix, p. 115.

25.   "Em vez de transcrever laboriosamente, a partir da língua estrangeira, expressões e tudo o mais, lia um trecho, fechava o livro e pensava em como um escritor alemão teria dado vestimenta aos mesmos pensamentos - método não muito comum entre tradutores." (E. Jones, op. cit., v. i, p. 66-67.)

26.   S. Freud,"Das Ich und das Es", in Studienausgabe Bd. III, p.292n.

27.   S. Freud, "Neue Folge der Vorlesungen zur Einführung in die Psychoanalyse", in Sudienausgabe Bd. i, p. 509.

28.   S. Freud, "Bemerkungen über einen Fall von Zwangsneurose", in Studienausgabe Bd. vii, p. 59.

29.   S. Freud, Zur Psychopathologie..., p. 119n. A citação feita por Freud possui diferenças de pontuação e de aspas em relação ao texto de Nietzsche, conforme a edição da Kritische Studienausbage. Embora o original seja um pouco mais claro, optou-se aqui por manter a forma apresentada por Freud.

30.   S. Freud, Über einen autobiographisch beschriebenen Fall von Paranoia in: Bd. vii. p.179

31.   S. Freud, "Alguns tipos de caráter encontrados na prática psicanalítica", in Obras completas, p. 229.

32.   S. Freud, "Zur Gechichte der psychoanalytischen Bewegung", in Gesammelte Werke Bd. x, p. 53.

33.   Freud falava antes de Schopenhauer.

34.   S. Freud, "Selbstdarstellung", in Gesammelte Werke Bd. xiv, p. 86.

35.   O paralelismo dessas formulações foi-me ressaltado por Oswaldo Giacoia Junior.

36.   P. Gay, op. cit., p. 58.

37.   P. Gay, op. cit., p.58.

38.   E. Jones, op. cit., v. i, p. 325. A citação de Nietzsche é de Assim falou Zaratustra.

39.   M. Onfray, Le crépuscule d'une idole - L'affabulation freudienne, p. 29.

40.   M. Onfray, op. cit., p. 42.

41.   M. Onfray, op. cit., p. 40.

42.   "Supondo que nada seja ‘dado' como real, exceto nosso mundo de desejos e paixões, e que não possamos descer ou subir a nenhuma outra ‘realidade', exceto à realidade de nossos impulsos - pois pensar é apenas a relação desses impulsos entre si [...]. A questão é, afinal, se reconhecemos a vontade realmente como atuante, se acreditamos na causalidade da vontade: assim ocorrendo - e no fundo a crença nisso é justamente a nossa crença na causalidade mesma -, temos então que fazer a tentativa de hipoteticamente ver a causalidade da vontade como única." (F. Nietzsche, Além do bem e do mal, aforismo 36).

43.   P.-L. Assoun, "L'Héritage de la Psychanalyse", Magazine Litteraire, n. 298, Avril 1992, p. 99, apud O. Giacoia Jr., "Sobre saúde mental: A natureza proteiforme das pulsões", p.35.



Referências bibliográficas

Freud S. (1997). Bemerkungen über einen Fall von Zwangsneurose. In: Studienausgabe Bd. VII. Frankfurt am Main: Fischer Verlag.

____. (1997). Das Ich und das Es. In: Studienausgabe Bd. III. Frankfurt am Main: Fischer Verlag.

____. (1989). Das Unheimliche. In: Studienausgabe Bd. IV. Frankfurt am Main: Fisher Verlag.

____. (1996). Die Traumdeutung. In: Studienausgabe Bd. II. Frankfurt am Main: Fisher Verlag.

____. (1997). Jenseits des Lustprinzips. In: Studienausgabe Bd. III. Frankfurt am Main: Fisher Verlag.

____. (1997). Massenpsychologie und Ich-Analyse. In: Studienausgabe Bd. IX. Frankfurt am Main: Fischer Verlag.

____. (1989). Neue Folge der Vorlesungen zur Einführung in die Psychoanalyse. In: Sudienausgabe Bd. I. Frankfurt am Main: Fischer Verlag.

____. (1987). Sobre os sonhos. In: Obras completas, v. V. Rio de Janeiro: Imago.

____. (1998). Zur Psychopathologie des Alltagslebens. Frankfurt am Main: Fischer Verlag.

____. (1991). Zur Gechichte der psychoanalytischen Bewegung. In: Gesammelte Werke Bd. X. Frankfurt am Main: Fischer Verlag.

____. (1991). Selbstdarstellung. In: Gesammelte Werke Bd. XIV. Frankfurt am Main: Fischer Verlag.

Gay P. (2007). Freud - Uma vida para nosso tempo. São Paulo: Companhia das Letras.

Giacoia Jr. O. (2001). Nietzsche como psicólogo. São Leopoldo: Unisinos.

____. (2006). Sobre saúde mental: A natureza proteiforme das pulsões. Discurso, v. 1, fac. 36, São Paulo.

Jones E. (1989). A vida e obra de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, v. I e II.

Masson J. (org.). (1986). A correspondência completa de Sigmund Freud para Wilhelm Fliess. Rio de Janeiro: Imago.

Nietzsche F. (2008). Humano demasiado humano II. São Paulo: Companhia das Letras.

____. (2004). Ecce Homo. São Paulo: Companhia das Letras.

____. (2004). Além do bem e do mal. São Paulo: Companhia das Letras.

Onfray M. (2010). Le crépuscule d'une idole - L'affabulation freudienne. Paris: Grasset.

Schlesier R. (1997). Freud, lecteur de Nietzsche. L'Inactuel, n. 7, Paris : Calmann-Levy.





Abstract
Considering the similarity between many theoretical constructions of Friedrich Nietszche’s and Sigmund Freud’s thinking, questions are raised about the occurrence of an influence of the philosopher’s ideas on the psychoanalyst. This article discusses what could be sated about it based on information on the Freud’s contact with Nietszche’s theory and what was published by Freud himself.


Keywords
Freud; Nietszche; Psychoanalysis; eternal comeback; “beyond-man”, dreams.

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 TEXTO

Freud e sua sombra

Freud and his shadow
Alfred Michaelis Michaelis

Friedrich Nietzsche começa seu texto "O andarilho e sua sombra" com um inusitado diálogo. Eis que a sombra subitamente começa a falar:

A sombra Como há muito tempo que não te escuto, quero te dar uma ocasião de falar.

O andarilho Alguém fala - onde? quem? É como se eu escutasse a mim mesmo, mas com uma voz ainda mais fraca do que a minha.

A sombra (após um instante) Não te alegra ter oportunidade de falar?

O andarilho Por Deus e tudo o mais em que não creio, minha sombra fala; eu escuto, mas não acredito[1].

 

A sombra não é, para Nietzsche, tão somente uma companhia, mas também elemento inseparável do esclarecimento e inspiração para o andarilho, ao reconhecê-la, declamar suas convicções mais profundas em um profícuo discurso que durará até o lusco-fusco, momento no qual desaparecem tanto luz quanto sombra.

 

A sombra, todavia, nem sempre tem êxito em iniciar uma conversa. Penso em outra situação, dessa vez real, na qual a sombra, apesar de acreditada, é ignorada até o fim. Trata-se de outro diálogo, um que poderia ser bastante promissor, mas que nunca ocorreu, e chama a atenção nunca ter ocorrido. Seria tão natural uma ampla aproximação de Nietzsche e Freud que sua inexistência ensejou tentativas de estabelecê-la, seja por meio de ficção[2], seja por meio de obras de grande valor acadêmico como Nietzsche und Freud, de Reinhard Gasser[3], e Freud et Nietzsche, de Paul-Laurent Assoun - obras essas cujos títulos reforçam a imagem de dois companheiros.

 

Certamente não foi ausência de assuntos comuns o motivo de Freud não ter dialogado com as ideias do filósofo alemão, que fora também um pioneiro nos estudos psicológicos. Como afirma Oswaldo Giacoia Junior, "Nietzsche atribui à psicologia uma função central no conjunto de seu pensamento: do âmago de seus escritos fala um psicólogo, como jamais houve antes"[4], e tal psicologia não seria tão somente uma disciplina que está ao lado das demais, mas uma "grande psicologia" situada em um nível hierárquico superior, seria a "senhora de todas as outras ciências, na medida em que por ela passaria o caminho que conduz aos problemas fundamentais do espírito"[5] - senhora inclusive da filosofia. Nietzsche possuía consciência disso, como deixa claro ao refletir sobre seus escritos em Ecce Homo: "Antes de mim não havia absolutamente psicologia. - Ser nisto o Primeiro pode ser uma maldição, é em todo caso um destino"[6]. Não devemos pensar, entretanto, que uma afirmação como essa decorre de ignorância concernente à existência de toda uma tradição de estudos psicológicos, bem como psiquiátricos. Nietzsche tinha conhecimento do andamento dessas disciplinas, mas, para ele, essas estavam presas a uma racionalidade empobrecedora que precisava ser superada. Decerto, essa autointitulação de pai da psicologia deve ser entendida por uma desqualificação da psicologia tradicional e pela fundação de uma nova psicologia, que desvela um mundo constituído por certas perspectivas dominantes, ou seja, um mundo humano constituído por significados, que, em última instância, são inteiramente dependentes da disposição das forças psíquicas.

 

Há, de fato, muitos pontos que permitiriam uma comunicação entre ambos, seja pela proximidade dos fenômenos visados, seja pela semelhança de muitas elaborações teóricas. Não é, no entanto, o caso de explorá-los aqui, ainda mais porque tal tarefa já foi realizada com primazia por autores como Gasser e Assoun. O que resta em aberto é confirmar se o pai da psicanálise chegou a ter contato significativo com o pensamento nietzschiano, e se este deixou rastros. Nietzsche permaneceu acompanhando Freud como uma sombra, já que as semelhanças entre os dois levantaram, e ainda levantam, suspeitas de que houve influência do filósofo em certas construções da psicanálise, de tal forma que Freud viu-se exigido a pronunciar-se sobre o assunto, tanto privadamente para conhecidos quanto publicamente para seus leitores. Suas explicações, entretanto, não satisfizeram a todos e chegam inclusive a alimentar a crença de que Freud procurou ocultar uma fonte teórica. Para trazer, portanto, alguma luz a essa questão, é preciso seguir os passos de Freud, tentando encontrar pistas da presença nietzschiana.

 

Presença nietzschiana na vida de Freud

Como Freud pouco se manifestou sobre Nietzsche, somente podemos supor o quanto ele tinha familiaridade com as ideias do filósofo, mas é certo que não se tratava de algo que lhe era estranho. Apesar de poucas, essas manifestações revelam grande estima pelas teses nietzschianas, e, além disso, sabemos que Freud convivia com estudiosos do pensamento nietzschiano, o que certamente contribuía para uma aproximação, mesmo que indireta, entre ambos. Cito resumidamente os relatos sobre esse contato.

 

Em um interessante trabalho intitulado Freud, lecteur de Nietzsche[7], Renate Schlesier aponta que os primeiros contatos com o pensamento nietzschiano teriam ocorrido quando Freud participava da "Associação de leitura dos estudantes alemães de Viena", um grupo dedicado à leitura de textos de filosofia. Freud havia entrado no grupo bem jovem, com 17 anos, ou seja, em 1873, permanecendo até 1878, período este das primeiras publicações de Nietzsche. É digno de nota que o grupo contava também com Victor Adler, Heinrich Braun, Siegfried Lipiner e Josef Paneth, todos marcados pelo pensamento de Nietzsche em suas vidas intelectuais posteriores. Os dois últimos chegaram inclusive a manter algum contato com o filósofo e conheceram-no pessoalmente. O contato de Lipiner foi breve, mas Paneth (um amigo bastante próximo de Freud, seu "amigo Joseph" de A interpretação dos sonhos) encontrou-se constantemente com Nietzsche entre dezembro de 1883 e março de 1884, e Schlesier afirma que Freud foi amplamente informado tanto por carta quanto oralmente das animadas discussões desses encontros[8]. Vale ressaltar que é justamente da época desse grupo de leitura que surge o primeiro registro do nome de Nietzsche sob a pena de Freud. Trata-se de uma carta de 13 de março 1875, quando Freud tinha então 18 anos, endereçada a seu amigo de juventude Eduard Silberstein, na qual é citada a acusação presente na Primeira consideração extemporânea de Nietzsche sobre o filistianismo de David Strauss.

 

Após esse momento de interesse claro pela filosofia, não há mais referência a Nietzsche até uma carta do início de 1900, escrita pouco tempo após a publicação de A interpretação dos sonhos e poucos meses antes da morte do filósofo, destinada a seu amigo Wilhelm Fliess na qual Freud confidencia: "Acabo de adquirir um Nietzsche, em quem espero encontrar palavras para muito do que permanece emudecido em mim"[9], embora afirme em seguida que ainda não o havia aberto por estar demais preguiçoso. Freud não indica nessa carta de qual livro se tratava, mas Peter Gay, biógrafo de Freud, indica que eram as obras reunidas do filósofo, que lhe haviam custado um bom montante[10]. Seja qual tenha sido o resultado dessa procura, e se foi realmente levada a cabo ou não, o simples fato de querer procurar no filósofo alguma inspiração não é uma afirmação qualquer.

 

Anos mais tarde, quando a psicanálise já era um fato cristalizado e atraía cada vez mais seguidores, Nietzsche continuava presente entre os próximos de Freud. É o que nos mostra o relato deixado por Ernest Jones, colega e também biógrafo de Freud, sobre duas reuniões da Sociedade Psicanalítica de Viena dedicadas ao pensamento de Nietzsche que ocorreram em 1o de abril e 28 de outubro de 1908[11], e é curiosa a diferença com que Freud trata o tema em cada reunião. Se na primeira Jones nos conta que Freud disse achar "a abstração da filosofia tão fria que desistira de estudá-la" e que "Nietzsche de modo algum influenciara suas ideias", na segunda reunião "Freud discorreu sobre a surpreendente personalidade de Nietzsche. Aqui ele tinha várias sugestões estimulantes a fazer, [cuja publicação não anteciparei repetindo-as aqui.[12] Mas] por várias vezes ele disse que Nietzsche teve um conhecimento de si mais penetrante que o de qualquer outro homem que já tivesse vivido ou que viesse a viver".

 

Posteriormente, por ocasião do Congresso de Psicanálise de 1911 realizado em Weimar, cidade onde o filósofo passou seus últimos anos, Hanns Sachs e Ernest Jones aproveitaram a oportunidade e foram ao encontro da irmã de Nietzsche para prestar homenagem ao filósofo e comentaram sobre a "semelhança de algumas das ideias de Freud com as de seu famoso irmão"[13]. Esse Congresso serviu para pôr em contato Freud e Lou Andreas-Salomé, que havia sido muito próxima de Nietzsche. Lou frequentou o Congresso e chamou a atenção de Freud por sua inteligência, o que resultou em uma duradoura amizade entre ambos.

 

Em 1931, Freud escreve a Lothar Bickel sobre sua carência natural de talento para a filosofia, e, em oposição ao seu desejo confidenciado a Fliess três décadas antes, afirma: "... deixei de lado o estudo de Nietzsche, embora - ou melhor, porque - estivesse claro que eu encontraria nele percepções muito semelhantes às psicanalíticas"[14].

 

A última vez que Nietzsche é noticiado na vida de Freud foi quando este, então com 82 anos, deixa Viena rumo a seu exílio em Londres. Obrigado a levar apenas parte de seus bens, entre os trinta e um títulos filosóficos que carrega consigo, vinte e três deles correspondiam a uma edição completa das obras de Nietzsche[15]. Indicando que a intenção de ouvir o filósofo permaneceu até o fim de sua vida.

 

Parece seguro dizer, portanto, que Nietzsche foi uma figura presente para Freud, quando não por vontade própria, ao menos por vontade das pessoas que lhe eram próximas. Isso levanta, evidentemente, a questão de se essa presença deixou reverberações em seu pensamento.

 

Presença nietzschiana na obra de Freud

Encontrar traços nietzschianos nos textos de Freud é uma tarefa realizada sobre um solo mais firme, mas, como veremos, não o suficiente para retirar as dúvidas concernentes ao grau de conhecimento sobre as ideias do filósofo.

 

É digno de nota que nas primeiras referências a Nietzsche o nome dele não é evocado. Foram duas ocorrências de um conceito nuclear do pensamento nietzschiano, a "transmutação de todos os valores" (Umwertung aller Werte), que aparece destacado entre aspas. Freud, de acordo com Schlesier[16], provavelmente julgou desnecessário citar o autor naquele momento em que as ideias dele tornavam-se mais difundidas, ao menos entre seus leitores. O conceito, em ambas as ocasiões, aparece relacionado aos mecanismos das elaborações oníricas. A primeira em A interpretação dos sonhos, em que Freud afirma que "entre o material do sonho e o sonho ocorre efetivamente uma total ‘transmutação de todos os valores psíquicos' (Umwertung aller psychiscen Werte)"[17]. A segunda em Sobre os sonhos[18], em que o conceito de Nietzsche é utilizado para designar o processo de deslocamento dos elementos do sonho[19].

 

Outro conceito de cunho nietzschiano, "eterno retorno do mesmo" (ewigen Wiederkehr des Gleichen), aparece na obra de Freud também sem referência ao autor. Ocorre uma vez, com uma ligeira adaptação e sem aspas, em O inquietante (1919), quando Freud refere-se a "o constante retorno do mesmo (beständige Wiederkehr des Gleichen), a repetição dos mesmos aspectos, características, vicissitudes, crimes, até dos mesmos nomes através de diversas gerações sucessivas"[20]. Ocorre novamente, dessa vez literalmente e com aspas, em Além do princípio do prazer, dentro do quadro teórico envolvendo a pulsão de morte, para ajudar a descrever a ideia de "compulsão à repetição"[21].

 

Há vezes, todavia, em que o nome de Nietzsche é expressamente citado. São onze ocorrências em dez textos distribuídos ao longo de toda a produção psicanalítica de Freud: A interpretação dos sonhos (1900), Psicopatologia da vida cotidiana (1901), Observações sobre um caso de neurose obsessiva (1909), Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia (1911 [1910]), Sobre a história do movimento psicanalítico (1914), Alguns tipos de caráter encontrados na prática psicanalítica (1916), Psicologia das massas e análise do eu (1921), O eu e o isso (1923), Autobiografia (1935 [1924]), Novas conferências introdutórias da psicanálise (1933 [1932])[22]. Dados a extensão da obra de Freud e o seu hábito de sempre citar seus autores prediletos, vê-se que tal quantidade não é muito significativa, e esse número torna-se ainda menos relevante ao vermos que apenas duas citações tratam diretamente do texto nietzschiano.

 

Dessas duas ocorrências, a primeira está num acréscimo de 1919 a A interpretação dos sonhos, no qual Freud comenta sobre a "exatidão das falas de Nietzsche ao dizer que ‘nos sonhos se perpetua uma época primitiva da humanidade, que não podemos mais alcançar por uma via direta'"[23]; e a segunda na Psicologia das massas e análise do eu, em que Freud ilustra o pai da horda primeva servindo-se da figura do "além-do-homem, que Nietzsche aguardava somente no futuro"[24]. São apenas duas citações e em nenhuma delas há desdobramentos dos dizeres nietzschianos: trata-se tão somente de breves comentários que Freud utiliza para reforçar suas próprias ideias. De todo modo, o que chama a atenção é a ausência das referências dessas citações. No caso da primeira dessas citações, ela corresponde, conforme aponta Schlesier, aos aforismos 12 e 13 de Humano, demasiado humano, que procuram, justamente, apresentar o sonho como resquício de uma racionalidade criativa que foi civilizada, na sua porção desperta, pelo homem lógico. Entretanto, a citação indicada entre aspas por Freud - "ein uraltes Stück Menschtum fortübt, zu dem man auf direktem Wege kaum mehr gelangem kann" - não está presente nos textos de Nietzsche. Na opinião de Schlesier, isso parece indicar que Freud cita de memória e não com o livro aberto ao seu lado. Seja como for, a falta de literalidade não é algo que deve provocar controvérsias, uma vez que Freud não dava a isso muita importância, como já o mostra o método usado por ele nas traduções feitas durante sua juventude[25].

 

Em outras seis aparições do nome de Nietzsche, não é o texto do filósofo que é citado: trata-se de comentários sobre leitores de Nietzsche. É o caso, por exemplo, de seu amigo Georg Groddeck, de quem Freud toma o termo "isso" [Es] para descrever o comportamento das forças inconscientes e comenta, em uma nota do O Eu e o Isso, que Groddeck havia retirado o termo de Nietzsche[26]. Anos mais tarde faz o mesmo esclarecimento em Novas conferências introdutórias da psicanálise[27]. É também o caso do "Homem dos ratos"[28], que em sua análise cita um trecho de Nietzsche a respeito da influência de fatores afetivos sobre a memória, mesma citação que depois Freud acrescenta em 1910 por meio de uma nota de rodapé à Psicopatologia da vida cotidiana, na qual diz com um grande elogio ao filósofo: "Nenhum de nós conseguiu descrever o fenômeno e sua base psicológica tão exaustivamente e também tão impressionantemente como Nietzsche em um de seus aforismos (Além do bem e do mal, 68): "Isso eu fiz, diz minha ‘memória'. Isso não posso ter feito, diz meu orgulho e permanece inflexível. Por fim - a memória cede"[29]. Em Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia, Freud, ao afirmar que o sol mencionado por Schreber seria um símbolo sublimado do pai, relembra que uma paciente já havia feito essa mesma associação por meio de um trecho de Assim falava Zaratustra e comenta, em nota, que Nietzsche conheceu seu pai somente quando era criança, indicando assim que o trecho em questão pode ser sido, desde sua origem, inspirado efetivamente pela busca do pai ausente[30]. Por fim, em Alguns tipos de caráter encontrados na prática psicanalítica, Freud escreve que um amigo havia lhe chamado a atenção para um discurso de Zaratustra que aborda uma espécie de motivação ao crime semelhante ao que Freud descrevia sob o título de "criminoso por sentimento de culpa"[31].

 

Nas outras duas referências, certamente as mais interessantes para nossa investigação, o nome do filósofo surge como se Freud precisasse dar alguma explicação. São dois momentos em que Freud expõe um pouco de sua trajetória e da psicanálise, afirmando que não era familiarizado com o pensamento de Nietzsche e que se manteve propositadamente afastado de seus livros.

 

O primeiro em Sobre a história do movimento psicanalítico, em que ele nos diz:

 

Mais tarde, recusei o alto gozo que ocasionam as obras de Nietzsche me dando como motivo, em todo conhecimento de causa, que não gostaria de ser incomodado por qualquer espécie de representação de expectativa na elaboração de minhas impressões psicanalíticas. É por isso que eu devia estar disposto - e eu o estava voluntariamente - a renunciar a toda pretensão de prioridade nos numerosos casos nos quais a laboriosa pesquisa psicanalítica só pode confirmar as visões que o filósofo obteve intuitivamente[32].

 

Depois, em sua breve autobiografia, a última vez que citou o nome do filósofo:

 

Quanto a Nietzsche, o outro filósofo[33] cujos pressentimentos e visões frequentemente coincidem da maneira mais espantosa com os resultados laboriosos da psicanálise, eu justamente por isso evitei por muito tempo. É que a prioridade me importava menos do que conservar um espírito não prevenido[34].

 

São onze anos que separam um texto do outro, todavia o conteúdo é praticamente o mesmo: no primeiro texto Freud diz que "recusou" (versagt) enquanto no segundo que "evitou" (gemieden) ler Nietzsche para manter a mente desimpedida; ao mesmo tempo reconhece a proximidade de pensamento ao afirmar que em muitos casos "a laboriosa pesquisa psicanalítica apenas pode confirmar as vias que o filósofo obteve intuitivamente" e que os "pressentimentos e visões [de Nietzsche] frequentemente coincidem da maneira mais espantosa com os resultados laboriosos da psicanálise"[35]. Curioso Freud, ao mesmo tempo que reconhece a semelhança teórica, querer marcar tão claramente uma diferença: enquanto Nietzsche intuía, pressentia e tinha visões, a psicanálise é capaz de fornecer certezas por meio de árduo trabalho empírico.

 

Vereditos

É possível que Freud tenha sido sincero, que ele sabia das semelhanças de pensamento e que preferiu manter-se afastado, ainda mais porque provavelmente bem sabia que seria questionado sobre esse assunto. Comportamento que, é preciso frisar, seria legítimo. E é nessa direção que caminha a opinião de Gay, que nem mesmo coloca Nietzsche entre as principais referências de Freud:

 

Freud procurava mestres em vários séculos: gregos, Rabelais, Shakespeare, Cervantes, Molière, Lessing, Goethe, Schiller, além daquele espirituoso alemão, amante da natureza humana, do século XVIII, Georg Christoph Lichtenberg, médico, viajante e autor de memoráveis aforismos. Esses clássicos significavam mais para ele do que o intuitivo psicólogo moderno Friedrich Nietzsche[36].

 

Parece claro para Gay que não há mistério na restrita presença do filósofo. Chama a atenção, de todo modo, que ele procurou ressaltar que justamente Nietzsche não fazia parte do círculo de influências teóricas do inventor da psicanálise. Teria ele saído em defesa de Freud? Não deixa de ser revelador de um certo incômodo o fato de o biógrafo sentir a necessidade de afastar o filósofo. Ele visivelmente fia-se às explicações de Freud, embora reconheça algum exagero no que tange à declaração de não dar importância em não ser o precursor do desvelamento do aparelho da alma:

 

Freud alegou [...] que não estava disposto a ser desviado de seu trabalho sério por "um excesso de interesse"; preferia a informação clínica que poderia recolher na hora da análise às percepções explosivas de um pensador que, à sua maneira idiossincrática, havia antecipado algumas das hipóteses mais radicais de Freud. Freud insistira que nunca tivera qualquer pretensão de prioridade - uma negativa demasiado taxativa para ser totalmente exata - e apontaria os textos psicológicos do médico e filósofo alemão Gustav Theodor Fechner como os únicos que lhe pareceram úteis[37].

 

Por mais que seja legítima a motivação dada, essa recusa por parte de Freud não deixa de intrigar. Afinal, trata-se aí da renúncia feita pelo pai da psicanálise, explorador do inconsciente, à investigação dos achados deste que, segundo ele próprio, teve "um conhecimento de si mais penetrante que o de qualquer outro homem". Recusa ainda mais enigmática devido ao fato de ele afirmar obter grande prazer em sua leitura.

 

Que Freud teve contato com o pensamento nietzschiano, não há nenhuma dúvida. As questões que permanecem giram em torno da extensão e profundidade desse contato e se houve ecos dele na descoberta freudiana, mas aí nada podemos fazer senão conjecturas. É preciso reconhecer, todavia, que quem deixa aberta a possibilidade para especular é o próprio Freud com afirmações de desconhecer e de evitar Nietzsche enquanto demonstra admirá-lo. Há algo de enigmático no trato que ele dá ao filósofo. Pode haver a sensação de algo escondido. O que tem levado a supor uma maior influência do pensamento nietzschiano do que Freud estaria disposto a admitir.

 

É o que Jones parece indicar ao dizer que na autoanálise de Freud, iniciada em 1896, logo após a morte de seu pai, Freud "estava aprendendo a verdade da máxima de Nietzsche: ‘O seu próprio eu estava escondido de você mesmo: de todas as minas do tesouro, a sua própria é a última a ser escavada'"[38]. Talvez Jones tenha feito tão somente uma aproximação entre dois pensadores que são suas referências teóricas, entretanto a frase pode sinalizar sua opinião da presença de influências do pensamento do filósofo em um Freud que começava suas investigações anímicas.

 

Essa é claramente a opinião de Schlesier, que vê a autoanálise de Freud como "uma apropriação e uma transformação" da leitura dos textos de Nietzsche. Segundo a autora, a presença mais ou menos constante do pensamento nietzs­chiano teria de fato provocado certa influência não pouco significativa no caminho percorrido pelo psicanalista. Influência que o psicanalista teria preferido manter oculta, e os artifícios utilizados para tanto não fechariam a questão, já que, levanta a autora, citar um autor de segunda mão não prova que ele não conheça de primeira mão, e que as declarações de Freud sobre a recusa de ler Nietzsche só podem ser afirmadas "após um conhecimento aprofundado de sua obra". A autora, embora não se mostre convencida pelas explicações dadas por Freud, não chega propriamente a acusá-lo de má-fé de que Freud teria secretamente recorrido às ideias nietzschianas para compor sua teoria psicanalítica, ela prefere sugerir que tenham aparecido "reverberações nietzschianas" oriundas principalmente dos tempos de juventude em que Freud teria lido Nietzsche, assim como do entorno impregnado pelas ideias do filósofo.

 

Nesse mesmo viés, só que de forma muito mais determinada, encontramos o filósofo hedonista Michel Onfray, que leva às últimas consequências a ideia nietzschiana de filosofar com um martelo, pretendendo pôr abaixo a instituição freudiana. Com desinibida virulência, Onfray vem escrevendo livros com tal propósito, nos quais descreve Freud "como bom nietzschiano que negava sê-lo"[39] e o freudismo como "um retorno singular do nietzschianismo"[40]. Eis um trecho no qual o autor abre questões que, instantaneamente, já encaminham suas respostas:

 

Em sua vontade furiosa de querer-se sem deuses nem mestres, Freud faz de Nietzsche o homem que se deve diminuir. [...] Por que Nietzsche? Em nome de quais estranhas razões? Para proteger o que e a quem? Com a finalidade de sufocar quais segredos? Que significa, nele, essa ardente paixão por negar a filosofia e os filósofos, mais precisamente um filósofo, somente um filósofo, nada mais que um filósofo? De fato, para um homem sedento de fama, a filosofia conduz com menos facilidade do que uma descoberta científica ao reconhecimento planetário[41].

 

Freud seria, portanto, não muito mais do que um ladrão de ideias, um plagiador que teria colocado roupagem científica nas palavras de Nietzsche com o objetivo de tornar-se famoso.

 

Curiosa essa convicção sustentada por dados que nada provam. Certeza que parece alimentada mais pela intenção que motivou a pesquisa do que pelos resultados desta. Tomemos o próprio Nietzsche a afirmar que nossos julgamentos sobre as coisas são, em última instância, perspectivas indissociáveis da vontade de cada um[42]. O fato é que, apesar de haver uma suspeita legítima e bem fundamentada, qualquer veredito sobre esse assunto será nada mais do que uma doxa, cuja intenção é inocentar ou culpar Freud.

 

Mais do que acusar Freud de vaidade e querer esconder uma fonte que removeria parte do brilho de suas descobertas, parece-me mais correto ver que a relação com Nietzsche é ambígua. Admiração e recusa. Vontade de lê-lo e vontade de não ser guiado. Ambiguidade porque Freud claramente não desejava tornar-se um nietzschiano.

 

É bem verdade que Freud dá sinais de que foi um leitor atento de Nietzsche e de que possui alguma familiaridade com seu pensamento. Entretanto, mesmo que ele tenha procurado ocultar isso, nada significa que ele o conheça em profundidade, muito menos que a teoria nietzschiana seja a receita oculta da teoria psicanalítica. Quando Freud diz que abdicou a ler Nietzsche, não disse que o desconhecia, que nunca o lera. Lamentava não ampliar a leitura. Por mais que a ambiguidade em relação a Nietzsche levante suspeitas concernentes à influência de algumas ideias da psicanálise, parece-me um passo grande demais afirmar que Freud tivesse escondido algo, intencionalmente ou não.

 

Tome-se por exemplo o fato de Freud ter feito um acréscimo em Psicopatologia da vida cotidiana, quase dez anos após sua publicação, retomando a citação de Nietzsche feita por seu paciente, o Homem dos Ratos. Isso indicaria a preocupação em escotomizar a origem de uma ideia ou indicaria, meramente, a descoberta de uma citação que corrobore seus próprios pensamentos? Será que servir-se da mesma citação mais de uma vez pode ser interpretado como atitude de quem deseja ocultar a fonte da ideia? Mesmo o fato de Freud ter escolhido justo os livros de Nietzsche para levar a Londres não significa necessariamente a exposição de um segredo, pode significar apenas o desejo de ler na sua velhice o que até então havia se privado - afinal, se é o caso de escolher uma quantidade pequena de livros para carregar consigo, é plausível escolher os ainda não lidos ou não explorados suficientemente. E, de modo geral, se Freud estava imerso em meios onde circulavam ideias de Nietzsche, isso pode significar realmente que não havia como evitar o contato com elas, todavia, pode também justificar que esse fosse superficial.

 

Seja como for, é importante notar que a opção declarada por Freud de evitar ser contaminado pelas ideias do filósofo está de acordo com as regras fundamentais da associação livre e da atenção livremente flutuante, cuja importância reside em permitir, com a mente desimpedida, à experiência clínica revelar-se.

 

Frente à incerteza, e mais razoável do que entrar em especulações, o que é possível afirmar é o que foi dito por Paul-Laurent Assoun: que a psicanálise "pode ser inscrita na posteridade daquele que se apresentava como o primeiro psicólogo da moralidade"[43]. Nietzsche foi e continuará sendo uma sombra para Freud, tagarela e incômoda, mas ser sombra não é desmérito, é destino dos grandes pensadores.


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Percurso é uma revista semestral de psicanálise, editada em São Paulo pelo Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae desde 1988.
 
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