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Resumo
Este artigo discute o conceito de Clínica Extensa, postulado na Teoria dos Campos, a partir de uma experiência de intervenção psicanalítica num hospital geral. Clínica extensa não é só a aplicação do método psicanalítico a situações exteriores ao consultório, mas principalmente a recuperação dele num contexto particular.


Palavras-chave
Teoria dos Campos; método psicanalítico; clínica extensa.


Autor(es)
Ana Cristina Cintra Camargo
é psicanalista formada pelo Instituto Sedes Sapientiae e mestre em Psicologia Clínica pela PUCSP.

Sonia Soicher Terepins
é psicanalista do Instituto da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.


Notas

1 Quando houver a menção HC no texto, estamos nos referindo ao ICHCFMUSP – Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo.

2 L. Barone et al., A psicanálise e a clínica extensa, p. 23.

3 L. Barone et al., op. cit., p. 24.

4 F. Herrmann, Introdução à Teoria dos Campos, p. 59.

5 Idem, op.cit., p. 60.

6 Parte extraída da Dissertação de mestrado: Clínica extensa, de Ana Cristina Cintra Camargo.

7 A. C. Camargo, op. cit., “Entrevista com Fabio Herrmann”.



Referências bibliográficas

Barone L. et al. (2005). A psicanálise e a clínica extensa. São Paulo: Casa do Psicólogo.

Camargo A.C. (2004). Clínica extensa. São Paulo: pucsp. (Dissertação de mestrado.)

Herrmann F. (2001). Introdução à Teoria dos Campos. São Paulo: Casa do Psicólogo.





Abstract
This article covers the concept of Extensive Clinic presented in the Multiple Fields Theory based on psychoanalytic intervention experience at a general hospital. Extensive clinic is not only applying the psychoanalytic method to situations that are external to the offi ce, but particulary reconsidering such a method.


Keywords
extensive clinic; psychoanalytic method; Theory of the Fields.

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 TEXTO

Clínica extensa

enfermeiros dos ambulatórios do HC [1] em busca de identidade e comunicação


Extended practice
Nurses of the São Paulo Hospital das Clínicas searching for identity and communication
Ana Cristina Cintra Camargo
Sonia Soicher Terepins


Fabio Herrmann nos dizia ter sido capturado ao longo de sua vida por uma única idéia – a recuperação do método psicanalítico. Como analista, professor e escritor, foi generoso nas modalidades e variantes da técnica, fazendo jus à amplitude da vocação do método. Na despedida a Fabio falou a família, falaram os amigos, os colegas, os pares. Faltou o depoimento do aluno, do aprendiz. Fabio nos olhou e deu voz a todos – do Mato Grosso, de Minas, dispôs-se a ouvir o interior de tantos: sem dúvida em parte para divulgar suas idéias, mas principalmente porque acreditava que o conhecimento, ao ser repartido, não se perde: genuíno professor, genuíno mestre. E é assim que gostaríamos de dialogar neste artigo, como mestre. Como Fabio defi niu na Conferência de Abertura ao III Encontro Psicanalítico da Teoria dos Campos, “aquele que conduz a travessia da incerteza” [2].

O trabalho que apresentaremos ilustra o que Herrmann chamou de clínica extensa.

A primeira idéia que desperta a expressão clínica extensa é a da aplicação do método psicanalítico a situações exteriores ao consultório, tais como o hospital, a clínica universitária, a consulta médica, a escola e, de modo geral, a prática junto à população desprovida de recursos. Em si, nada há de errado nesse entendimento usual. Merece, porém, uma precisão. Por clínica extensa, não pretendo referir-me tão-só à extensão a outros domínios, como também à recuperação daquilo que constitui nosso patrimônio original, em parte abandonado, com o tempo. Como a atenção analítica é sempre clínica, a psicanálise da cultura e da sociedade, a correlação de mão dupla com a literatura e as artes, a própria integração com o reino das ciências, tudo isto é clínica extensa [3].

A clínica extensa consiste em um movimento no qual se estende o método psicanalítico para o mundo, para qualquer produção humana, seja social, literária ou individual. A psicanálise proposta pela Teoria dos Campos é concebida nas diversas formas em que for possível a aplicação do método e se dá sempre que haja a possibilidade de um encontro humanizador.

Este artigo tem o intuito de compartilhar uma experiência de intervenção psicanalítica dentro de um hospital geral. Tivemos o privilégio de acompanhar Fabio Herrmann trabalhar, pudemos vê-lo criar um dispositivo técnico a partir do pedido de socorro da equipe de enfermeiras da hematologia do hc. A solicitação veio por meio do pedido de um curso para capacitar o grupo a lidar com situações extremas que vivenciavam no dia-a-dia: uma equipe submetida a um alto nível de estresse. Após alguns encontros, optou-se por oferecer um curso terapêutico, cuja proposta era funcionar semanalmente como grupo de investigação, tratamento e treinamento para a produção de multiplicadores da função terapêutica. Surgia então o conceito de gift: Grupo de Investigação em Função Terapêutica, e que postulava: o caminho da pesquisa é em si mesmo terapêutico. Os grupos funcionaram uma vez por semana com duração de uma hora e meia. Participamos desta experiência durante um ano como ouvintes/aprendizes.

O sofrimento psíquico, tanto individual quanto grupal, cristalizara-se sob a forma de sintomas. O método psicanalítico seria uma das alternativas para intervenção, criando condições para o exercício da função terapêutica. Função terapêutica é o conceito que, na Teoria dos Campos, sustenta a extensão da clínica. É a atividade de cuidar, na qual o sujeito é tomado inteiramente em consideração. É um mecanismo de comunicação entre percepção, emoção viva e sentidos que se formam nas relações humanas. Uma das vias indispensáveis de transmissão da função terapêutica consiste no contágio por meio do campo transferencial, ou seja, a imersão na experiência. A função terapêutica examina para cuidar e, em psicanálise, cuida-se interpretando. É a interpretação que vai permitir que se revelem verdades intrínsecas, um desencontro produtivo. É aquilo que se escuta tomado por outro ângulo, estranhando o que é dito, sem no entanto tomar partido.

Para o autor, isso acontece na síntese de dois movimentos: deixar que surja, que exige do analista uma atitude de disponibilidade receptiva, para que o possível sentido se faça presente e tomar em consideração, uma receptividade ativa, ocasião em que o analista se utiliza do que surge como ponto de partida para um movimento. Implica dizer ou fazer algo que chame atenção do paciente/grupo para o que está se passando. Uma fala, um gesto, um silêncio pode cumprir a função. Adotando esta postura, nos colocamos a serviço do método psicanalítico, tal como postulado na Teoria dos Campos. A ruptura de campo, conceito assim definido por Herrmann, “é uma descrição essencial do efeito das interpretações psicanalíticas na sessão e, por causa disso, é também a forma mesma de todo conhecimento psicanalítico legítimo” [4]. Isso signifi ca deixar que o método psicanalítico se faça por nosso intermédio ao assumirmos a escuta transferencial. Para Herrmann, a interpretação é o processo que leva à ruptura de campo e considera o processo de descobertas dos campos, por ruptura, como “o selo autêntico do saber psicanalítico” [5].

O trabalho realizado com a equipe de hematologia, coordenado por Fabio Herrmann, teve repercussão dentro do hospital e duas outras clínicas solicitaram que grupos fossem formados com suas equipes: os ambulatórios e o centro cirúrgico. Cada grupo teve um desenrolar específi co e singular, reproduzindo os sintomas dos quais tratavam.

Assim, enquanto o sintoma da hematologia se manifestava como baixas na equipe, o grupo dos centros cirúrgicos deixava transparecer nas relações de seus integrantes uma assepsia de contato humano, semelhante à necessária no cuidado dos pacientes. Já o modus operandi dos ambulatórios refl etia a maneira como os pacientes se sentiam: pouco acolhidos, dispersos espacialmente e sem identidade. Veremos como isso se dava apresentando a intervenção.

O pedido dos enfermeiros dos ambulatórios ocorreu de forma distinta do grupo da hematologia: em vez de ser um pedido dos enfermeiros, foi feito pela chefe. Ao saber da existência do grupo da hematologia, a chefe dos ambulatórios pensou que seria interessante que os enfermeiros do PAMB (Prédio dos Ambulatórios) se benefi ciassem também de uma experiência semelhante.

Esse grupo era constituído por profi ssionais de vários lugares do hospital: ambulatório, internação, experimental etc. Embora fossem pessoas coordenadas por uma mesma chefi a, não trabalhavam juntas, muitas vezes em ambulatórios distintos, em locais físicos distantes. Tratava-se de uma confi guração bem específi ca, diferente das enfermarias, nas quais os profi ssionais têm um convívio diário e uma mesma tarefa compartilhada.

O desejo da chefe era o de melhorar as relações no ambiente de trabalho mas, contraditoriamente, isso acabou gerando muita desconfi ança nos grupos. O grupo se questionava a respeito do uso a ser feito dos relatos, bem como da intenção dos encontros. Embora não fosse expressa textualmente nos encontros iniciais, essa desconfi ança aparecia nas entrelinhas, como medo de se exporem nos grupos. Para os enfermeiros, não ficou claro o motivo da criação dos grupos. Esse foi um de nossos primeiros desafi os: diminuir a desconfi ança dos enfermeiros. Aos poucos, os vários códigos de funcionamento foram sendo revelados; uma espécie de regimento interno invisível, que atribuía diferentes valores conforme o ambulatório do qual se fazia parte. “Ah, você é da experimental?”, “Hum, você é da oftalmo!” Por sermos de fora do hospital, não sabíamos o valor, a gradação subentendida nesta tabela. Mas as interjeições nos sinalizavam se era bom ou ruim. De fato, existem diferenças hierárquicas nos lugares ocupados. Nossa segunda tarefa foi transformar o conjunto em um grupo de fato.

Os enfermeiros dos ambulatórios são considerados a linha de frente do hospital. Atendem a uma quantidade enorme de pacientes e não podem parar. Isso impede o olho no olho. O início desses grupos teve uma tônica: o assunto da falta de tempo. Falta de tempo para fazer bem feito, falta de tempo para fazer xixi, falta de tempo para si. Queixavam-se de que eram muito cobrados e de que muitas vezes a cobrança não levava em conta se era possível ou não atender o pedido: “ninguém pergunta, ninguém quer saber!”.

Em um dos encontros, uma enfermeira nos disse que para ela era muito difícil se fazer importante, poder tirar os quinze minutos a que tinha direito. Era isso que gostaria de partilhar com o grupo, suas difi culdades em colocar limites. Conta, por exemplo, que certa vez, bem na hora em que estava indo ao banheiro, apareceu o médico pedindo o foco de luz. Logo em seguida surgiram outros exemplos de pedidos de atenção. A sessão agitada, todos querendo que o seu exemplo pudesse ser ouvido e sua queixa levada em consideração. Respondemos que todos precisavam ser ouvidos, desejavam um pouco de atenção.

Uma enfermeira que estava quieta começou a falar que no dia anterior tivera uma mesma situação com o foco. Ela o havia utilizado e estava bem. Surpreendentemente este mesmo foco, que estava funcionado perfeitamente, estava com os fi os rompidos e a lâmpada não acendia. E o reator, que também deveria funcionar, apresentava problemas. Parecia que ele ia conectar e depois apagava. No fi nal das contas, quase como por providencia divina, o reator a salvou. E todos do grupo concordaram, rindo: é preciso dar a luz!

Era certo que precisava vir à luz um estado de espírito que propiciasse um maior contato humano e afetivo. Tal trabalho permitiria que se abrissem clareiras de humanização, que a escuta descentrada permitisse que a fala desvelasse novos sentidos, e que viesse à luz o que estava na sombra.

Aos poucos, fomos sendo apresentadas aos vários setores do hospital. Apresentaram-nos também duas figuras importantes: o balcão de informação e a ouvidoria. Tais lugares haviam se transformado em figuras concretas e onipresentes, personagens e tanto. A ouvidoria é um lugar dentro do hospital que poucos conhecem. Para nós, coordenadoras, foi uma surpresa. A ouvidoria nos foi apresentada como o local para onde devem ser encaminhadas as queixas que o profi ssional não tem condições de dar conta ou que não lhe competem. As reclamações, portanto, devem ser encaminhadas para lá.

No grupo, os enfermeiros davam dicas sobre como receber os pacientes que chegam ao balcão:

Dica 1: dizer “bom dia” em alto e bom som, preferivelmente acompanhado de um sorriso.

Dica 2: quando o paciente não tem condições de entender as instruções, pedir-lhe que traga um acompanhante. Muitas vezes, espere ouvir que seu acompanhante é Deus…

Davam-nos dicas também sobre abusos de pedidos de ajuda, tanto por parte dos profi ssionais, como dos pacientes. Há profi ssionais que faltam e/ou se atrasam por causas justas; outros, certamente não. Assim também acontece com os pacientes. Como diferenciar o paciente que está mal e aquele que encena?

Dica 3: mande-o para o ps (Pronto-Socorro). Assim você saberá: se o paciente estiver realmente mal, ele gostará de ser encaminhado; caso contrário, “melhorará rapidinho”: a não ser que não conheça o ps…

De qualquer modo, o denominador comum consiste no fato de que as pessoas gostam de se sentir olhadas, cuidadas, e que há diferentes maneiras de se abordar e conversar com alguém. Assim, também, aquele grupo de enfermeiros dos ambulatórios também precisava ser olhado e escutado. Precisava ser escutado, pois muitas vezes se sentiam desqualifi cados em sua identidade por não trabalharem em uma enfermaria específi ca. Com freqüência realizavam serviços burocráticos ou serviços bem diferentes das tarefas para as quais tinham sido contratados, tais como trocar lâmpadas, verifi car focos de luz, localizar outros profi ssionais etc. O enfermeiro, no entanto, é aquele que sempre está presente, diferentemente dos outros profi ssionais que trabalham em um hospital.

Nós, coordenadoras, funcionávamos como as ouvidoras de plantão, oferecendo um lugar para que pudessem falar e se sentir escutados.

Em um dos encontros, resolveram ajudar em nossa localização dentro do prédio dos ambulatórios: cada um contribuía à sua maneira, e até propuseram um passeio pelo hospital. Explicavam que o térreo, a entrada do hospital, na verdade era o quarto andar.

Outra enfermeira explicava detalhadamente onde cada setor se localizava. No primeiro andar, o hemocentro, doação de sangue, oncologia… Tentavam desenhar espacialmente as localizações. A sensação que tínhamos era do hospital como um grande labirinto. Perguntamos em tom de brincadeira se eles recebiam mapas para aprenderem a se localizar. Outra enfermeira insistia em mais explicações, tentando nos convencer de que era fácil, bastava seguir sua descrição. E assim fi camos sabendo que no quarto andar se concentra o maior número de setores. O acmg – Ambulatório da Clínica Médica Geral, o agd – Ambulatório Geral Didático, parte do ps; a sala 7, do Eletro; a sala 8, do Registro. E depois, ainda, outro enfermeiro complementa com mais informações, siglas e gestos. Até que, em determinado momento, chegamos à sala que estávamos utilizando para nossos encontros. Perguntamos a qual bloco nossa sala pertencia. A resposta que obtivemos foi que nossa sala não fi cava em bloco nenhum e sim entre dois blocos. E observamos, surpreendidas para o grupo, que a nossa era uma sala de interligação.

Propor uma escuta psicanalítica num hospital geral é um trabalho novo. Requer treino e cuidado. Muitas vezes é preciso ouvir e ouvir. É preciso dar tempo para que se aprenda a escutar o que é dito. O grupo tem um timing que deve ser respeitado. Alguns comentários, ricos em simbologia, levam tempo para ganhar trânsito.

Ao longo do ano, construímos quatro apostilas que tentavam ilustrar ao grupo seu funcionamento, ou seja, o movimento das falas, as reações emocionais, os conteúdos latentes do discurso. Nas apostilas retomávamos os encontros anteriores destacando as falas mais signifi cativas, evidenciando-lhes seus movimentos emocionais.

É importante ressaltar que o pedido do grupo veio sob a forma de um curso que lhes permitisse um funcionamento mais harmônico, facilitando a integração da equipe. A utilização das apostilas foi a forma encontrada de levar em consideração o pedido formulado e oferecer uma resposta ao pedido manifesto de um curso. De forma alguma era uma concessão ao método e sim uma variação da técnica especifi ca para este grupo.

A seguir, parte de uma das apostilas entregue a eles. Cabe ressaltar que a linguagem direta e coloquial é proposital, para que fosse inteligível para o público para o qual foi elaborada.

Já tivemos alguns encontros e os grupos estão falando de diversas coisas muito interessantes. Conseguimos abrir um espaço de conversa e estamos fazendo um treino de escuta. Já é um começo.

É interessante notar que todos vivem problemas parecidos, e isso é dito de várias maneiras: “Há problemas sempre! Não é fácil o dia-a-dia! Tem que saber priorizar dentre tantos afazeres, e como fi ca difícil a vida de vocês ao terem que administrar tudo que diz respeito à enfermagem e mais tantas outras coisas… O enfermeiro precisa fazer o meio do campo entre médico, a família e o paciente. Também é aquele que sempre está ali. Os outros profi ssionais podem agendar os compromissos, podem às vezes deixar para depois. Vocês, não! E o que acabamos por perceber é que, mesmo estando em enfermarias diferentes, enfrentam os mesmos problemas. Isto pode ser compartilhado por todos.”

Assim escutamos comentários do gênero: “Puxa, eu estava quietinha e me dei conta que ontem mesmo vivi uma situação extremamente parecida… como a que um colega estava relatando. Quando a gente percebe que o outro vive algo parecido, a sensação de se sentir diferente diminui”.

No nosso último encontro todos estavam de calça branca e de casaco azul. Uniforme bonito e que impõe respeito, e que tem a ver com a identidade profi ssional. É o uniforme de enfermeiro. Mas, justamente embaixo daquela uniformidade tem um “eu” diferente em cada um de vocês. A isso damos o nome de singularidade. Cada um pode falar da sua experiência particular e única. E o grupo pode oferecer um lugar para que isso possa acontecer.
[6]

A disposição física dos ambulatórios dificultava a comunicação e as trocas entre eles. Os coordenadores do grupo eram os estranhos a quem os enfermeiros se mostravam através de seus relatos, desde as pesquisas realizadas nas pequenas equipes ambulatoriais até os desafi os que enfrentavam no dia-a-dia. Os enfermeiros no grupo tinham a dupla função de serem a um tempo atores e platéia. Sentiam-se escutados e olhados, tanto em suas difi culdades como em seus desempenhos. Foi por meio desse contato em que cada um pode ser ouvido pelo outro que se deu a possibilidade de se reconhecerem como enfermeiros. O fortalecimento da identidade deu-lhes confi ança para não se sentirem somente os trocadores de lâmpadas.

Assim, os dois movimentos instaurados durante esse trabalho foram, de um lado, a constatação de que, embora trabalhando em locais distintos, todos faziam parte de um grupo que buscava lugares identitários e de acolhimento, e, de outro, que tinham condições de exprimirem seus anseios e dificuldades. As angústias apareciam como mensagens à procura de legendas e esta era a parte mais importante de nosso trabalho.

Conversando com Fabio sobre a intervenção no hospital, ele nos disse:

Foi uma experiência fascinante, eu aprendi muito lá. Estavam em jogo naquele momento os sentimentos mais pungentes e mais profundos da vida humana. A técnica tinha que acompanhar isso. Mas a técnica não é uma coisa fria! Pergunte ao Paulo Autran. Técnica de teatro não é nada fria. É a forma possível de expressão de uma intensidade emocional. Vocês devem ter reparado nos vários movimentos técnicos que eu fazia, uma espécie de sinalização de trânsito, dirigindo a palavra para cá ou para lá, redistribuindo as tensões emocionais. E, sem dúvida, a visão da clínica extensa é muito importante para o futuro. [7]
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